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sábado, 27 de outubro de 2018

Aprendendo a tirar tanino forte de uva de casca fina: memórias “Pinot Noir” da turma 53 do curso de certificação da Sommelier School, em São Paulo


Por Rogerio Ruschel
Meu prezado leitor ou leitora, passei um fim de semana me sentindo uma uva Pinot Noir. Explico. Quanto mais tempo o sumo da uva tinta ficar em contato com a casca durante a fermentação, mais estrutura, com tanino e cor o vinho poderá ter. Algumas uvas, como a Pinot Noir, tem a casca mais fina e é necessário mais tempo de contato com o sumo para se obter cor e taninos. Pois isso foi o que aconteceu comigo - e provavelmente com alguns dos meus 16 colegas da turma 53 do curso Nível 1 do curso de Formação de Sommelier Internacional da ISG. No fim de semana estudei muito, fiquei por horas em contato com a apostila do curso para “pegar estrutura e tanino” e poder enfrentar a prova final. 
O curso da ISG - International Sommelier Guild, representada com exclusividade no Brasil pela Sommelier School de São Paulo, tem três níveis com dificuldades crescentes e é aceita internacionalmente, como me disse Marcelo Asnis, um dos diretores. Fiz o 1o. Nível – Intermediate Wine Certificate que tem 24 horas-aula e a degustação de 48 vinhos (alguns deles na foto abaixo). No final enfrenta-se uma prova com 60 questões e uma degustação cega onde temos que adivinhar tudo. O professor foi o jornalista Beto Duarte. O Nível 2 – 16 aulas (96 vinhos) e Nível 3 – 32 aulas (451 vinhos), qualifica e prepara os alunos para os títulos de “Master of Wine” e “Master Sommelier Internacional”. 

No início me parecia fácil, afinal há muitos anos leio, pesquiso, entrevisto, visito, degusto e escrevo sobre vinhos. Mas preferi passar pela “sessão Pinot Noir”.  A apostila do curso (aliás muito interessante e divertida de ler) tem quase 200 páginas e inclui não só as características das principais uvas, mas o perfil de solos e terroirs, o detalhamento de processos industriais, vocabulário especializado e um imenso conjunto de características dos vinhos. Que tal identificar uma uva a partir da descrição de suas bagas e cachos, pelo tipo de doença que pode enfentar ou sua preferência por tipo de solo? E saber quais as diferenças entre vinhos da mesma uva produzidos em uma região do Novo Mundo e do Velho Mundo?  Por isso tive que ler e reler a apostila de 200 páginas, repassar os slides e rever as fichas de degustação durante o fim de semana. No momento em que escrevo esta matéria ainda não tenho o resultado, porque a correção das provas é feita na sede da ISG, nos Estados Unidos. Mas acho que fui bem, vamos esperar. 

 Dividi esta experiência com 16 colegas (acima), com diferentes objetivos. Marcos Buturi, especialista em carnes, gestor da área de restaurantes da JBS, é um enófilo com grande capacidade olfativa e uma bela adega em casa, e fez o curso apenas por prazer pessoal, não pretende ser sommelier. “Vinho é uma eterna descoberta de novas experiências e sabores, é um prazer interminável, por isso quero conhecer melhor”, afirma. A bancária Fernanda Eiko Kinoshita também fez o curso por prazer pessoal, mas não descarta a possibilidade de fazer o Nivel 2 e trabalhar profissionalmente com vinhos.
O argentino Gustavo Gamarra é garçon em um restaurante italiano de São Paulo e acredita que o curso pode ajudá-lo profissionalmente. “Não penso em me tornar imediatamente um sommelier, porque nem todos os restaurantes podem ter um sommelier, mas se for um garçon promovido a maitre, fico mais próximo do sommelier”, diz. No sentido contrario, o brasileiro Guilherme Segantini morou na Argentina onde se apaixonou por vinhos, fez vários cursos, mas decidiu fazer o curso em São Paulo para ter um conhecimento mais amplo do mercado internacional. “Na Argentina até tres anos atrás era proibitivo importar vinhos, então só se trabalhava com vinhos argentinos; agora quero ampliar meus conhecimentos”. 

Mas o curso atende outros objetivos. O casal Luis Marcelo Pioli e Crisley Fernandes de Andrade Pioli moram em Jacutinga, no sul de Minas Gerais, onde produzem café. No municipio da “capital nacional da malha” e estância hidromineral, há tres anos estão trabalhando para produzir vinhos, o que deve se realizar a partir do ano 2020. Com assessoria dos agrônomos de sua equipe, plantaram Syrah, Cabernet Sauvignon e Pinot Noir. Estão fazendo o curso para aperfeiçoar os conhecimentos e se preparar para as próximas etapas do negócio, porque, como diz Luis, “exportamos café e conhecemos pessoas do ramo, mas precisamos estudar muito para fazer vinhos com qualidade para mercados internacionais”. 

Georgio Robert também não pretende ser sommelier, mas como trabalha com vendas em uma importadora de vinhos, acredita que a certificação da Wine Certification vai ajudá-lo a atender melhor seus clientes e a abrir mercado para ser um educador sobre o assunto. E Marcia M. Novais, que atualmente trabalha em uma loja de shopping center, faz o curso para “agregar valor ao que gosto” como diz. E acrescenta: “Adoro vinhos. Vinho é muito criativo e eu adoro novidades. Quando você conhece vinhos tem menos pena de investir em qualidade.” Quando janta com o namorado, ela é quem escolhe o vinho, informa com uma indisfarçável alegria. 
O que com certeza aprendi no curso é que o mundo da vitivinicultura oferece possibilidades para pessoas de bom gosto de diversas maneiras. Brindo a isso e a todos que investem em conhecimento para melhorar sua vida, seja profissionalmente, seja emocionalmente. Caros companheiros e companheiras da 53, tim-tim!
 

sábado, 13 de outubro de 2018

In Vino Viajas ultrapassa a marca de 2,5 milhões de leitores, com 250.343 acessos em agosto, mais de 8.300 page-views por dia!


Por Rogerio Ruschel
Meu prezado leitor ou leitora, neste mes de outubro estou de aniversário e ganhei um belo presente dos meus leitores: conforme o site Easy Counter, que faz relatórios para a indústria da internet, meu blogue In Vino Viajas atingiu 2.508.224 page-views em pouco mais de seis anos! Veja o destaque na imagem de abertura.
Veja também, indicado por setas, que nos últimos dois meses os acessos foram de 250.343 em agosto (8.344 page-views por dia), e de 100.705 em setembro (3.356 page-views por dia). Apenas como referência, a Vinicola Aurora e a Miolo – duas das maiores vinicolas do Brasil - registraram cerca de 550 page-views diários no mes passado, e a Vinicola Garibaldi registrou 1.650 page-views/dia. Veja abaixo. 
Esta é mais uma prova de que bom jornalismo tem audiência e interesse, no mundo todo.
 

Atualmente In Vino Viajas está presente em duas plataformas:
1.      Na Blogspot, criado em maio de 2012 (www.invinoviajas.blogspot.com.br), sobre o qual publiquei os dados acima.
2.     na WordPress, criada em janeiro de 2017 para ser uma plataforma internacional (www.invinoviajas.com) que contém todo o conteúdo do blogue na plataforma blogspot além de outros. Atualmente são 536 reportagens publicadas, cerca de 14.000 acessos por mes, e continua crescendo.
Além dos milhares de leitores nos blogues In Vino Viajas em Português, também escrevo em uma coluna no portal especializado espanhol Vinetur. Em julho de 2018 publiquei uma entrevista exclusiva com José Peñin, criador e presidente do famoso Guia Peñin de vinhos da Espanha, que teve mais de 3.500 acessos em uma semana – veja aqui: https://www.vinetur.com/posts/3465-jose-penin-exclusivo-nuestro-gran-patrimonio-es-el-numero-de-vinas-viejas-de-variedades-autoctonas-el-negativo-es.html

Campanha ousada promove o vinho do Brasil para os brasileiros, do jeito que eles são: alegres, descontraídos, informais e divertidos

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Por Rogerio Ruschel
Meu prezado leitor ou leitora, proponho um brinde ao Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin) que finalmente assumiu suas próprias pesquisas e se convenceu de que o vinho brasileiro pode (e deve) ter “a cara” dos brasileiros - e não mais utilizar a cartilha formal dos vinhos europeus.
Há séculos os produtores de vinhos europeus usam o marketing para transformar o vinho em uma bebida para “momentos especiais”, que deve ser consumida com alimentos especiais. Alegam que sofisticando o consumo se pode “agregar valor”, mas isso é capitalismo Brut com marketing Reserva para justificar preços abusivos e elitistas. Por exemplo: qual o argumento racional que justifica uma garrafa de vinho custar R$ 42.000,00?  Isso só é possivel quando atitudes emocionais superam a racionalidade. O problema é que a base de consumidores não está se renovando, e a indústria europeia só sobrevive porque mercados gigantescos como a China abriram os portões. E no Brasil há muito tempo  perdemos a batalha de mercado de vinhos finos de mesa para os importados, como mostra o quadro abaixo.

Os produtores dos Estados Unidos, especialmente da California, apostam muito mais em qualidade (e gastronomia, lazer e turismo) do que em sofisticação artificial com os tais “momentos especiais”. E em menos de 30 anos se transformaram no maior mercado consumidor do mundo, um dos que mais recebe enoturistas e um dos mais importantes países produtores. Eles entenderam que para aumentar a margem é preciso aumentar o volume, e para aumentar o volume é necessário conquistar novos consumiodores diariamente, simples assim. Já publiquei aqui no In Vino Viajas os resultados desta estratégia, veja o link no final do texto. E já publiquei também como funcionam duas armadilhas psicológicas da propaganda que enganam seu cérebro e fazem você comprar produtos e vinhos mais caros: o Efeito Placebo e o Efeito Halo, veja no fim deste texto.  
Pois pesquisas de vários lugares do mundo vem indicando que este caminho da superficialidade e sofisticação não está criando mercados e não se sustenta a longo prazo. Pesquisas também informam que as novas gerações de consumidores – Millenials e outros - estão preferindo bebidas mais econômicas e criativas, como as energéticas que “dão asas”. O Ibravin já sabia disso há muito tempo (algumas destas pesquisas estão em seu site desde 2008 - veja o link no fim deste texto), mas só agora decidiu enfrentar o comodismo.
Reconheço que o Instituto Brasileiro do Vinho está tomando uma louvável iniciativa ao romper a inércia e nadar contra a correnteza. O Instituto vai tomar uma série de iniciativas para promover o aumento da base de consumidores de vinho no Brasil, focando especialmente nos  Millennials, o grupo de consumidores nascidos nas décadas de 1980 e 1990 e responsáveis por 52% do poder de compra no mercado interno brasileiro.
O objetivo, conforme Oscar Ló, presidente, é “desmistificar o processo de escolha e consumo de vinho e levar uma mensagem mais leve, descontraída e menos burocrática da bebida”. Perfeito: na hora em que vamos retomar o crescimento, vamos criar novas relações conosco mesmo e talvez conseguir competir de verdade com a invasão do Mercosul. Cumprimento pela coragem porque o Ibravin vai enfrentar fogo amigo, mercado travado, produtores inertes – e especialmente a crítica de sommeliers, consultores e “blogueiros de vinho” que vivem de foografar “rótulos” importados recomendando harmonização com gastronomia esotérica. Eles vão chiar.
O gerente de Promoção do Ibravin, Diego Bertolini, informa que entre as estratégias para atrair este público estarão eventos de promoção para consumidores finais, ações com influenciadores e formadores de opinião (caso solicitem apoiarei) e uma campanha publicitária intitulada “Seu Vinho, Suas Regras”, que rompe conceitos de degustação formal do vinho, “impactando 55 milhões de pessoas só neste mês de agosto”. Está ótimo, boa sorte. Mas espero que o Ibravin insista na estratégia até que ela comece a dar resultados, o que leva tempo porque não se muda comportamento de consumo a curto prazo, especialmente depois de passar anos a fio dizendo o contrário e treinando garçons e sommeliers a sofisticarem a escolha do vinho nas mesas.
E quero lembrar também que uma comunicação e promoção de guerrilha, corajosa como essa, requer uma distribuição de guerrilha: não dá para competir com os “reservados” no território deles, que são as pontas de gôndola em supermercados que compram por containeres e operam por preço. Diego Bertolini do Ibravin vai ter que se esforçar para mobilizar os produtores brasileiros a também sairem do armário, digo da inércia, e criarem novas formas de distribuição, mais próximas dos Millenials.
O vídeo da campanha publicitária “Seu Vinho, Suas Regras” pode ser conferido no Facebook e no Instagram dos Vinhos do Brasil ou no canal do YouTube: https://www.youtube.com/watch?v=czW1D2bjByw. A campanha é bacana, mas faço uma ressalva sobre os anúncios: eles mostram pessoas sozinhas, mocinhas simpáticas com garrafas. Ora, os Millenials se caracterizam por socializar em Grupos e vinho é bom quando se toma com amigos. Então porque mostrar o consumidor (ou consumidora) sozinha, como uma pessoa solitária? E precisava estar com um maldito canudinho, o vilão ecológico da hora?

Meu caro leitor ou leitora, beba o vinho que você quiser, quando quiser. Escolha seus vinhos com suas regras. O melhor vinho é aquele que você gosta, e que bebe com os amigos. E o mais confiável é aquele que agrega valor por representar os valores do território e da comunidade que o produziu - e não de uma corporação sem nome, sem pátria e sem alma. Brindo a isso.

Entrevista exclusiva com José Peñin, do Guia Peñin, uma lenda viva da vitivinicultura espanhola e europeia.


Por Rogerio Ruschel


EXCLUSIVO - Meu caro leitor ou leitora, mais uma vez In Vino Viajas faz jornalismo de qualidade com essa entrevista exclusiva com José Peñin, fundador e presidente do Guia Peñin, uma das mais importantes personalidades do vinho da Espanha e da Europa. Esta entrevista está disponível em espanhol aqui: http://www.invinoviajas.com/2018/07/jose-penin-nuestro-gran-patrimonio/



José Peñin, nascido em 1943 em Santa Colomba de la Vega, La Bañeza, León, e apreciador de vinhos com as uvas prieto picudo e mencía, da região de sua infância, é uma lenda viva da vitivinicultura espanhola e mundial, um pioneiro de grande respeito e credibilidade. Em 1975, com 32 anos, comprou um Land Rover e começou a percorrer as vinícolas da Espanha. Foi o primeiro a criar um lagar, o primeiro a criar um clube de vinhos, o primeiro a fazer um guia de vinícolas e também o primeiro a avaliar vinhos e colocá-los em um guia – a primeira edição foi publicada em 1990. Na foto de abertura, foto de Penin publicada por el blog “Dastatu Rioja Alavesa” durante una entrevista para fortalecer la Candidatura del Paisaje cultural del vino y el viñedo de La Rioja y Rioja Alavesa a Patrimonio de la Humanidad de la UNESCO.



Dizem que Peñin já degustou mais de um milhão de vinhos. Pode ser exagero, mas ele mesmo diz que já visitou quase todas as regiões vinícolas do mundo como um excelente escritor, palestrante, consultor, membro prestigiado de diferentes júris internacionais, e ganhador de inúmeros prêmios por sua atuação profissional de 40 anos na indústria do vinho. Atualmente o Guia Peñín tem uma equipe reconhecida de especialistas que avaliam cerca de 11.000 vinhos por ano e publicam os resultados em espanhol, inglês, francês e alemão. O guia é um dos mais importantes do mundo e tem sido utilizado como uma alavanca estratégica para a Espanha conquistar e manter seu lugar entre os três maiores países produtores e exportadores de vinhos do mundo. Este ano o Guia Peñin já realizou salões (mostras gigantescas de produtores espanhóis) em Nova Iorque, Tóquio, Moscou e México City, além dos Salões na Espanha; e em breve estará novamente na China.

In Vino Viajas é o primeiro veiculo de comunicação do Brasil a publicar uma entrevista exclusiva com o Mestre José Peñin, feito do qual muito me orgulho, com perdão dos meus estimados leitores. Veja a seguir.



R. Ruschel - Como surgiu a sua abordagem ao mundo dos vinhos? Foi inspirado pela família, por amigos da Faculdade ou por acaso? Você tem herdeiros com a mesma paixão?


José Peñin - Foi com alguns amigos que criamos um clube de vendas de vinho por correspondência, com entregas pelo correio, em 1975. A intenção era puramente comercial. Infelizmente, meus filhos não entraram nessa cultura em nível profissional.

R. Ruschel - Na trajetória de mais de 25 anos do Guia Peñin, quais são as principais dificuldades que você enfrentou para fazer o Guia Peñin se transformar no sucesso que você tem hoje? E quais foram os momentos mais gratificantes?


José Peñin - Tive muita sorte na primeira edição que foi paga por um grande banco espanhol. Esta iniciativa permitiu conhecer os vinhos espanhóis com avaliação de qualidade pelos consumidores. Eram tempos com pouca informação sobre marcas de vinho. Eu não queria criar um livro pessoal, mas um vademécum que orientasse o consumidor. Por esse motivo e desde então, contabilizamos duas vezes o número de marcas do segundo guia de vinhos da Espanha. Os momentos mais gratificantes foram verificar que as vinícolas assimilaram melhor as críticas do que eu pensava. Talvez tenha sido o modelo de crítica, em um país que, como o nosso, onde as formas são tão importantes quanto o conteúdo em si.



R. Ruschel - Você disse recentemente que os vinhos que mais te entusiasmam hoje são os das aldeias, os vinhos da terra. Por quê? Você pode destacar qualquer região, tipo de uva ou um produtor em particular?


José Peñin - Em geral, os vinhos que mais me entusiasmam são os das áreas mais selvagens, com vinhas velhas e que durante décadas não foram trabalhadas e, portanto, ainda são mais virgens. Eles são principalmente vinhedos em áreas mais acidentadas com mato e floresta, dificeis.


R. Ruschel - Atualmente, qual é a atividade que você mais gosta: degustar vinhos já consolidados, descobrir novos vinhos ou escrever sobre o mundo do vinho?


José Peñin - Sempre gostei de escrever e descobrir novos vinhos ou novas experiências de vinho, mais do que beber os vinhos já consolidados.

R. Ruschel - Você é o autor e/ou editor de muitos livros. Qual deles deu mais prazer em ver pronto? Qual é o livro que você gostaria de ter escrito e ainda não escreveu?


José Peñin - Talvez o livro que mais me satisfez foi “12 Grandes Bodegas”, um livro que se refere às vinícolas mais antigas da Espanha, ainda em atividade. O livro que estou escrevendo agora é sobre minhas lembranças de 43 anos no mundo do vinho. Não se esqueça que este período coincidentemente tem sido a revolução do vinho em todo o mundo, não só em Espanha.

R. Ruschel - Você visitou muitos territórios de produção de vinho. Na sua opinião, quais são as três regiões vinícolas mais bonitas da Espanha? E do mundo?


José Peñin - Na Espanha, por sua orografia variada, há muitas paisagens evocativas. É possível que El Priorat, na Catalunha e El Bierzo, em León ainda me fazem parar para contemplá-las.


R. Ruschel - Quais são os principais aspectos positivos, facilidades e oportunidades dos vinhos espanhóis no contexto internacional? E quais são os principais aspectos negativos, as dificuldades, limitações?


José Peñin - O aspecto positivo é a grande variedade de estilos e marcas de qualidade dos vinhos espanhóis. Temos uvas evinhos para todo tipo de envelhecimento, de variedade, para todo tipo de clima, para sua multiplicidade de solos e para nosso grande património, único do mundo, que é ter o maior número de vinhas velhas relacionadas com variedades autóctones. O aspecto negativo é que o produtor de vinho espanhol não sabe vender bem o seu produto.


R. Ruschel - Quais são os principais desafios que os vinhos da Espanha enfrentarão em geral, nos próximos 10 anos?


José Peñin -  Conseguir maior competitividade em relação a outros países na promoção e comercialização e também que as Comunidades Autônomas espanholas tenham um objetivo comum de promoção para evitar a promoção solitária.






Veja a imagem acima. José Peñin sempre teve independência intelectual e cresceu fazendo alianças, mas sem depender de favores das vinícolas. No caso em que é um vinho sem permissão para identificar o DO, em uma caixa, da borda da estrada: quantos sommeliers você sabe quem recomendaria um "pecado" tão grande em seu próprio blog?

Recentemente perguntado sobre o que o emociona mais neste mundo de vinho, Peñin respondeu: "O discurso sincero de pessoas que respeitam a paisagem. Respeitar a paisagem significa avaliar tudo o que a paisagem lhe proporciona. Tudo Árvores, arbustos, plantas silvestres e, acima de tudo, a videira. Que esta vinha é cultivada naquela paisagem selvagem é o que determina um caráter para o vinho que não tem um vinhedo geométrico, instalado com todas as precauções agronômicas ".

Brindo a José Peñin pelos valores que professa e por sua percepção, dedicação e coragem.


In Vino Viajas já publicou mais de 50 reportagens sobre cultura do vinho na Espanha. Algumas delas estão aqui:

Artigo de José Peñin sobre visitantes corporativos a adegas: http://www.invinoviajas.com/2018/06/jose-penin/

Entrevista com o Presidente da Asociación de Museos del Vino de España: http://www.invinoviajas.com/2018/04/a-los-museos/




Exclusivo: opiniões, revelações e alguns segredos de Carlos Cabral, o maior comprador de vinhos do Brasil


Por Rogerio Ruschel

Meu caro leitor ou leitora publico hoje mais uma entrevista exclusiva com umas pessoa excepcional: desta vez com o maior comprador de vinhos do Brasil, Carlos Cabral, responsável pelas operações do Grupo Pão de Açúcar – o simpático senhor da foto acima. Se você trabalha com vinhos não pode deixar de ler, porque Cabral me revelou o “caminho das pedras” (ou das gondolas) para produtores, distribuidores e importadores colocarem seus vinhos nas prateleiras das lojas. Mas se você apenas gosta de vinhos, também não deixe de ler, porque em 50 anos de vida dedicada ao vinho, Cabral certamente pode dar conselhos de grande sabedoria.
O Grupo Pão de Açucar (GPA) é a maior rede varejista do Brasil, com mais de 2.000 pontos de venda. Cerca de 1.000 lojas são da divisão GPA Alimentar e vendem vinhos nas redes Pão de Açúcar (186 lojas), Extra (300), Minuto Pão de Açúcar (82), Mini Extra (183), Assai Atacadista (130 lojas) e Compre Bem. O grupo também opera um clube de vinhos, o Viva Vinhos Pão de Açúcar.  GPA ainda tem 900 lojas das marcas Casas Bahia, Pontofrio e Lojas Bartira. A empresa faz parte do Grupo Casino, da França, e é também a maior empregadora privada do Brasil em seu segmento, com cerca de 142 mil funcionários; depois do governo federal o GPA deve ser o maior empregador brasileiro.

Pois esta empresa vende milhões de garrafas de vinhos por ano, e o comprador se chama Carlos Cabral – ou Carlos Ernesto Cabral de Mello. Cabral me recebeu no seu escritório (foto acima) e me revelou muitas coisas, mas não me disse o quanto de vinhos compra e vende por ano. Mas certamente são milhares de caixas, provavelmente milhões de garrafas. Veja a seguir algumas das revelações de Cabral.
R. Ruschel – Quantos rótulos o GPA oferece a seus clientes? Quais os vinhos mais vendidos?
C. Cabral – “No Pão de Açúcar e no Extra já tivemos à venda mais de 1.000 rótulos,  mas atualmente são cerca de 800, o que é um ótimo número porque oferece todas as alternativas para quem compra e facilita um pouco mais para nós que recebemos, estocamos, distribuimos para as lojas e gerenciamos o processo em 17 Estados brasileiros. Em termos de volume, os vinhos mais vendidos são chilenos, com 44% do volume. Depois vem os vinhos de Portugal com 15%, 10% da Argentina, 9% da Italia, 4% da França e os restantes 18% são do Brasil, Espanha, Uruguai, Alemanha, Austrália, Nova Zelandia, Estados Unidos e outras regiões. (Nota do editor: Verifiquei no site do Extra: a rede oferece aproximadamente 147 rótulos chilenos, 196 vinhos na categoria europeus, e 129 rótulos brasileiros e de outros paises.)
R. Ruschel – Quem está crescendo e quem está perdendo mercado?
C. Cabral – Além do Chile que mantém a velocidade na conquista de mercado, os portugueses parece que redescobriram o mercado brasileiro de uns três anos para cá. E estão decididos a aumentar a presença. Os espanhois fizeram nitidamente uma opção pela China e se esqueceram do Brasil, e os franceses pouco investem, talvez porque se interessam apenas por segmentos de maior valor. Os argentinos se beneficiam dos acordos de Mercosul e da proximidade e mantém posição.
R. Ruschel – E os vinhos brasileiros? Em quais você mais confia na venda, que tem mais saída?
C. Cabral – Nossos espumantes, com certeza, vão contunuar crescendo a taxas mais elevadas do que os vinhos tranquilos. Pelo menos tem potencial para isso. Acertamos a mão. Viajo com frequência e vejo que o prestígio de nossos espumantes está cada vez maior. Temos boas vendas para espumantes da Cave Geisse, da Miolo, da Casa Perini, que tem ótimos moscatéis, os da Casa Valduga e das duas cooperativas, a Garibaldi e a Aurora. Todos tem espumantes de qualidade. Já entre os vinhos tranquilos destaco os da Miolo (da campanha gaúcha), os rótulos Talento e Desejo da Salton, o Pizatto Merlot, excepcional, e os brancos da Valduga, muito bons – entre outros. Outra coisa: o suco de uva brasileiro é o melhor do mundo. Feito com uvas Isabel, Concorde e Bermont em sua maioria, parece que você pega um cacho de uvas na mão, espreme e bebe, de tão bom que é. Os produtores brasileiros tem dificuldade de atender o mercado brasileiro; se nós não  comprarmos em julho, agosto, não vamos ter suco de uva para vender em toda a rede no final do ano e verão. De fato é o melhor do mundo. 
R. Ruschel – Porque o Pão de Açucar não vende vinhos mais caros, como outras lojas independentes que podem oferecer vinhos até 40 mil Reais?
C. Cabral – De fato na rede do GPA temos lojas com perfil para vender produtos nesta faixa de preço, como o Pão de Açucar do Shopping Iguatemi, em São Paulo, que tem o tiquet médio mais elevado da rede. Mas nós evitamos por uma questão de impacto social, pela conotação que isso pode ter. Pense nisso: um cliente chega no caixa e tira do carrinho uma ou mais garrafas de vinho custando centenas de Reais cada uma, talvez o salário de um mes inteiro da moça que está operando o caixa. Eu não gosto disso e a empresa decidiu não vender, é uma opção.
R. Ruschel – Qual o caminho das pedras para um vinho chegar às prateleiras do GPA?
C. Cabral - Primeiro o vinho tem que ser bom, tem que ter qualidade. O produtor ou importador agenda comigo uma apresentação, degusto alguma coisa e ele deixa amostras que mais tarde vou compartilhar com meus dois compradores, caso os rótulos tenham qualidade. Experimentamos todos e decidimos sobre o perfil de preço que ele deve ter, o potencial de volume de vendas e a margem da loja. Se os produtos passarem por esta primeira análise, os compradores vão entrar em contato com os vendedores para negociar volumes, preços, condições de pagamento, aspectos de merchandising (frentes, gondolas, degustadores, promoções) e outras coisas. Um vinho desconhecido não consegue se vender sozinho, precisa ter degustação, precisa de ajuda inicial no ponto de venda. Cerca de 180 pessoas trabalham comigo nas lojas degustando, promovendo, cuidando e ajudando os clientes a decidirem.


R. Ruschel – Você já escreveu seis livros sobre vinhos. Está trabalhando em outro?
C. Cabral – Tenho dois projetos. O primeiro é um livro sobre as mesas da minha vida. Será mais artístico. Nos últimos 40 anos passei por centenas de mesas de todos os tipos, de jantares com amigos ou familiares a banquetes empresariais para dezenas de pessoas. E todas elas com vinhos e historias, muitas historias interessantes. (Nota do editor: Cabral já publicou seis livros (alguns na foo acima). Um dos livros mais interessantes foi sobre “A mesa e a diplomacia brasileira: o pão e o vinho da concórdia”, com 264 páginas e muito elegante, no qual Cabral explora os 6,5 milhões de documentos do Museu Histórico e Diplomático do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Veja o link desta reportagem no fim desta.). O segundo projeto de livro é algo assim como “O vinho e eu”, para comemorar meus 50 anos como enófilo que vou comemorar em 2019. Mas nenhum dos livros tem plano de trabalho nem data. 
R. Ruschel – Como está o projeto de exposição da tua coleção de rótulos de vinhos do Porto?
C. Cabral – Comecei minha coleção no inicio dos anos 1970 e tenho mais de 8.100 rótulos. Parece que é a maior do mundo, uma parte já apresentei nos meus livros. Gostaria de fazer uma exposição em 2019, mas ainda não consegui local e os recursos para fazê-la.
R. Ruschel – O que você acha da campanha de desmistificação do vinho que está sendo feita pelo Ibravin?
C. Cabral – É uma excelente iniciativa. Sou fiador moral, dou meu total apoio e estou procurando ajudar com ações nas seções de vinhos brasileiros de nossas lojas. Agora a Ibravin sozinha não vai mudar nada, precisa do apoio dos produtores, das vinícolas, porque elas é que estão disputando no mercado e também de produtores de regiões do Brasil além da serra gaúcha, onde o Ibravin não atua. Espero que as vinícolas brasileiras entendam esta oportunidade e se aproximem do mercado, não apenas aumentem os preços. 
R. Ruschel – E por falar em preços, quais as principais políticas públicas que a vitivinicultura brasileira necessita?
C. Cabral – Isso não é difícil. Primeiro é preciso financiamento para a reconversão dos vinhedos. Isto leva cinco anos e o vitivinicultor tem este tipo de apoio em qualquer liugar do mundo, precisamos ter no Brasil. Depois, o óbvio: uma redução drástica de impostos. O vinho não deveria pagar, não pode pagar ICMS, deveria ser considerado um alimento como em vários outros países. 
R. Ruschel – Você já esteve em quase todos os destinos de turismo do vinho do mundo. Quais os mais interessantes na sua opinião?
C. Cabral – As pessoas tem percepções diferentes do que gostam, mas para mim o primeiro é o Chile. Fica mais perto de nós, tem roteiros próximos e distantes da capital, o verão chega a 42 graus, é muito seco, e eles fazem um vinho excelente; e é muito bonito, tudo foi montado para receber o turista com qualidade. Depois viriam os roteiros de Portugal, do Alentejo ao Douro, gosto de todos, também muito bonitos e com ótimos vinhos. E no Brasil a região do Vale dos Vinhedos, com destaque para Bento Gonçalves e Garibaldi, onjde parece que tudo está preparado para receber os turistas como deveria ser. 
Meu caro leitor ou leitora, Cabral continua com suas atividades de embaixador da cultura do vinho, com palestras e cursos. Seus vídeos de educação para o consumo, do qual o episódio Boas Maneiras, número 12, já teve mais 290.000 visualizações, um espanto, continuam, embora ele tenham me ditto que vai reduzir um pouco a velocidade.
Conheça a historia de Carlos Cabral e seu legado na forma de livros nesta outra entrevista que publiquei em julho de 2017 – http://www.invinoviajas.com/2017/07/conheca-carlos-cabral/