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terça-feira, 25 de maio de 2021

Arqueólogos e chefes de cozinha vão recriar o garum, um molho de peixe da Roma Antiga, desaparecido há 15 séculos

 

Por Rogerio Ruschel

Meu prezado amigo ou amiga, arqueólogos e chefes de cozinha portugueses vão recriar um molho de peixe muito utilizado na Antiguidade, e que desapareceu há cerca de 15 séculos: o garum, garo ou liquamen. O dia do início do processo preodutivo que pode levar até tres meses, é hoje: 26 de maio de 2021.

O garo (também chamado de garum, nome romano de um tipo de peixe) era um molho muito apreciado na Antiguidade, especialmente na Roma Antiga, de onde chegou na Peninsula Ibérica: na região do Alentejo Litoral, onde estão as ruínas romanas da cidade portuguesa de Tróia - o maior centro industrial de salgas de peixe do Império Romano - foram encontrados lagares para fazer o tal molho de peixe.

O garo era também muito requisitado em mesas chiques de outas regiões do mundo conhecido na Antiguidade, como em Atenas, na Grécia, onde foram encontrados vestígios de garo datadas do ano 5 a.C. Pesquisadores dizem que o garo era feito de sangue, tripas e outras partes de atum ou cavala, misturadas com sobras de outros peixes, crustáceos e moluscos esmagados. Esta preciosa mistura era deixada em salmoura durante cerca de dois meses, fedendo muito – tanto que o local da salga era bem distante dos centros urbanos!

Era um produto de alto luxo: registros mostram que 6,5 litros de garo foram vendidos por 1.000 denários – e saiba que um denário dava para comprar até 8 quilos de pão!

Pois na Península de Tróia, a menos de uma hora de Lisboa, região de badaladas praias e muitos hoteis charmosos, também está um conjunto de ruínas romanas onde foram encontrados lagares de produção do tal tempero. Neste local a equipe de arqueologia, do Tróia Resort, e do restaurante Can the Can vão realizar, depois de quinze séculos, uma produção de garo num dos tanques de salga de peixe deste complexo arqueológico.

O projeto se insere no Selo de Mar do Can the Can — conduzido pelo designer e investigador Victor Vicente e o chef Pedro Almeida — que visa estudar e recuperar as técnicas de conservação de pescado e inovar a partir da tradição. A equipe de arqueologia do sítio arqueológico de Tróia é liderada por Inês Vaz Pinto e conta com a participação das pesquisadoras na área alimentar Marisa Santos, Catarina Prista e Anabela Raymundo, do Centro de Investigação em Agronomia, Alimentos, Ambiente e Paisagem do Instituto Superior de Agronomia, e da zooarqueóloga Sônia Gabriel e da palinóloga Patrícia Mendes, do Laboratório de Arqueociências da Direcção Geral do Património Cultural.

O produto a ser recriado será um garo de sardinha num dos tanques das Ruínas Romanas de Tróia, na margem sul do estuário do Sado, a poucos quilómetros de Setúbal, um sítio arqueológico reconhecido como Monumento Nacional desde 1910 e inscrito, desde 2016, na Lista Indicativa Portuguesa do Patrimônio Mundial da Unesco,

O molho começará a ser feito no dia dia 26 de Maio, mês da deusa Maia, deusa romana da fertilidade, e será feito com 400 kg de sardinha fresca de Setúbal e sal produzido no vale do Sado – todos produtos com identidade local. Os cerca de 200 a 300 litros de molho produzido serão comercializados, embora não se saiba ainda detalhes.

Altamente protéico, o garo era usado como condimento e para aumentar a intensidade do sabor dos alimentos, sendo muito apreciado. Podia ser feito a partir de diversos tipos de peixe como sardinhas, anchovas, cavala, atum, moreias e outros tipos de pescado, que determinavam a sua qualidade e o seu preço. Em Tróia foram encontrados principalmente vestígios de sardinha, razão da escolha desta espécie para esta produção, além do simbolismo que a mesma representa para Portugal.

Fonte: Agricultura e Mar Actual

segunda-feira, 10 de maio de 2021

Os 20 benefícios de produtos e turismo com identidade territorial para o desenvolvimento local

 

Por Rogerio Ruschel*

 

Prezado leitor ou leitora, Muitos de nossos municípios foram duramente atingidos pela pandemia, especialmente os pequenos, porque práticamente todos os setores econômicos entraram em crise ao mesmo tempo: o comércio, a agricultura familiar, o turismo e as cadeias produtivas associadas a eles. Pois agora os potenciais consumidores dos produtos e serviços destas atividades estão ansiosos pela volta ao “normal” e começam a reaprender a trabalhar, a viajar, a consumir. Então dirigentes e gestores das cadeias produtivas do comércio, turismo, gastronomia, hotelaria, agricultura, industrialização e das indústrias criativas dos municípios precisam reaprender a viver. Vai ser difícil, mas em marketing se sabe que toda crise gera oportunidades – e neste caso muitas delas estão próximas, em casa, na sua rua, estocadas ao seu lado, só é preciso enxergá-las com as lentes da criatividade e – como se diz de maneira bem adequada – “fora da caixinha”.

 

Mas antes anote: a mensagem de mobilização que mais se ouve é “Prefira o comércio local”, mas eu sugiro que ela seja substituída por outra muito mais adequada: “Prefira o Produto local no Comércio local”. Sim, porque produtos locais tem um efeito multiplicador na geração de renda e emprego que amplia o comércio. E aí vai outra mensagem: para que fiquem mais competitivos, podemos agregar valor aos produtos locais por sua origem, sua identidade territorial, isto é valorizando o fato de que ele utiliza patrimônios disponíveis no SEU território e na SUA comunidade. Com isso eles se tornam Produtos ou Serviços de Base Local, os únicos que tem uma identidade territorial e os únicos que podem agregar valor de mercado diferenciado por causa disso. Sabe porque? Veja no quadro que abre este atigo.

 

Exemplos bastante conhecidos estão em agroalimentos, onde vários produtos tem uma percepção de valor ampliada no mercado global exatamente porque tem um “credenciamento” que vem do território onde são produzidos (como queijo Gruyére, vinho Bordeaux, Café da Colombia, Café do Cerrado Mineiro, chá Darjeeling, cachaça de Paraty, sapato de Franca, espumante de Champagne, presunto de Parma, etc.) ou pela matéria-prima ou processo utilizado para produzi-los (como Presunto Pata Negra da Extremadura, vinho de talha do Alentejo, própolis vermelho de Alagoas).

 

Estes são típicamente produtos Locais, de Agricultura Familiar, de pequenas indústrias, ou extrativismo, são produzidos em regiões delimitadas (territórios não necessáriamente limitados políticamente) e certificados com uma Identidade Geográfica - IG. Eles são produtos Locais mas se tornaram Globais, agregando valor de até 270% a mais no preço, conforme o relatório “European Commission - “Study on economic value of EU quality schemes, geographical indications (GIs) and traditional specialities guaranteed (TSGs)” de abril/2020.

 

Mas um produto que tem como “sobrenome” um território respeitável agrega valor não só a agroalimentos, mas a qualquer produto como por exemplo mármore de Carrara e a seda da China; ou a pessoas, como Leonardo da Vinci, Isabel de Castela ou Jesus da Galileia.

 

Porque isso acontece? Porque produtos locais não são padronizados e têm valores endógenos que derivam de sua origem, território, modo de fazer ou prática comunitária, de sua história, cultura, herança social – e isso cria um diferencial de marketing. Estes valores se tornam diferenciais exclusivos que não podem ser trocados, vendidos, ou modificados porque fazem parte de sua identidade. Por exemplo, o fabricante de outra região pode copiar seu produto mas não pode copiar o clima da sua cidade. A gestão do marketing de produtos locais o chamado brandingse baseia em valorizar estes diferenciais exclusivos e inimitáveis, o que valorize também o território que é seu “sobrenome”.

 

Ao contrário, a força de um produto global, similar e padronizado - como seu celular, pasta de dentes, um automóvel - está na produção em escala; sempre que o fabricante agrega um diferencial a um produto de linha (feature, matéria-prima, função, etc.), este diferencial é adotado para o produto ser produzido em todas as fábricas - e é imediatamente copiado pela concorrência. Assim, o valor do produto global está na marca (brand) que é um elemento externo, que pode ser trocado, copiado, falsificado, vendido. A gestão do marketing - o branding – de produtos globais se baseia em defender a marca contra similares e cópias.

 

O quadro abaixo resume a importância dos diferenciais competitivos no branding de marketing de diferentes épocas.


E quais são os patrimônios do território e da comunidade que podem estar associados a seu produto ou serviço? Vários, muitos, entre os quais recursos tangíveis e intangíveis de diferentes dimensões como:

 

·      Produtivos: como terras, plantios, maquinaria, infra-estruturas

·      Naturais: paisagens, solo, minerais, fauna, flora, água, ambiente natural

·      Intelectuais: o saber fazer, conhecimento, experiências, criatividade

·      Culturais: patrimônio histórico e cultural, acervo cultural comunitário

·      Sociais: valores, estruturas sociais, união, herança social comunitária, entre outros.

 

Um bom exemplo: as cervejas artedsanais (isto é, Locais) simplesmente estnao ocupando os espaços comerciais das cervejas industriais.

 

Outro exemplo: plantar lavanda é uma atividade agrícola na França (e em vários países), com o objetivo de produzir essências para perfumes e outros insumos industriais.

Um dia alguém resolveu transformar a lavanda em flor em uma atração turística e surgiram produtos como “romance na Provence”, “lua de mel com lavadas em flor” e outros.

Chega? Não, porque outro “alguém” teve a ideia de personalizar o lavandário francês com outro patrimônio francês, realizando desfiles de moda entre as flores.

 


Apostar nos produtos locais exige primeiro que a comunidade entenda o valor disso e perceba que precisa se unir; exige das liderancas do território promover a união de forças em vez da concorrência, para ampliar os poucos recursos financeiros disponiveis. Esta sinergia gera vários benefícios coletivos, entre os quais:

 

·      Aumenta a auto-estima dos moradores

·      Compartilha despesas com promoção e divulgação

·      Compartilha esforços de gestão

·      Contribui para a estruturação de cadeias produtivas de base local

·      Estimula a organização de grupos produtivos locais – APL

·      Facilita o desenvolvimento de novos produtos e sub-produtos

·      Valoriza a cultura local e Valorizar as propriedades rurais.

 

Mas a aposta em produtos locais com identidade territorial e comunitária também ajuda a alavancar o marketing, e entre os beneficios de marketing de uso do patrimonio territorial estão:

 

·      Aproveita oportunidades de nicho – cria produtos sem concorrência

·      Ganha espaço e visibilidade nas redes sociais – porque é novo

·      Enriquece o portfólio de ofertas do município – porque não precisa parar com os produtos antigos

·      Se beneficia da identidade do território

·      Evita comparação direta de preços

·      Atrai compradores pioneiros - que lideram tendências, postam e são seguidos

 

O turismo é uma atividade que se beneficia enormemente com uma identidade territorial e com isso mobiliza muitas cadeias produtivas na agricultura, industrialiazação e no comércio locais. Por exemplo a identidade territorial pode estar em atrações exclusivas, em Roteiros baseados na história, Roteiros baseados na geografia, Roteiros baseados na etnia e folclore, na natureza diferenciada, em sabores peculiares, em suvenirs com identidade.

 

Na Gastronomia a identidade vai estar em Pratos fpicos, Pratos étnicos, Receitas locais, Temperos exclusivos, Produtos exclusivos, Associando pratos à história e geografia, Associando pratos à cultura e arte.

 

Para encerrar, lembro duas coisas: a primeira é uma frase do “papa” mundial do marketing, Philip Kotler, que diz com sabedoria óbvia: “Os problemas de mercado de um produto só podem ser resolvidos de um jeito: atuando no mercado”.  A segunda mensagem também é óbvia: não adianta ter o melhor produto e a mehor estratégia, se o mundo não souber que seu produto existe. Então anuncie, divulgue, promova, se comunique para afugentar a bruxa da pandemia.

 

Porque os seus concorrentes vão fazer o mesmo, e podem engolir todos os clientes que planejavam conhecer o seu território e comprar os seus produtos e serviços.

 

Vamos em frente, porque quem fica parado é poste.

 

*Rogerio Raupp Ruschel é jornalista, consultor, professor e editor. Leia artigos sobre o valor dos produtos locais em “In Vino Viajas” (https://wpconseld.com.br/invinoviajas/) e veja 27 pequenos e divertidos vídeos de casos de sucesso de produtos globais que se tornaram globais no WebCanal TNFDQ – Tesouros no Fundo do Quintal em (https://www.youtube.com/channel/UCc4c2FU6Z88_XU_2I2lFbmA )  



 

 


quinta-feira, 6 de maio de 2021

96% da área de vinhedos na Espanha está em territórios com denominação de origem (Identidade Geográfica)

 

Por Rogerio Ruschel

 

Meu prezado amigo ou amiga, a Espanha é um dos três maiores produtores mundiais de vinhos e também um dos maiores exportadores. Todos os anos compete com a França e a Itália por uma das três primeiras posições. Então é importante saber que este poderoso país vitivinicultor se posiciona no mercado internacional utilizando a proteção e agregação de valor de produtos certificados com Identidade Geográfica. Como você sabe, produtos com uma denominação de origem valorizam sua identidade, o que cria um diferencial de marketing que agrega valor de mercado, aumentando a margem de lucro. No Brasil as denominações de origem são certificados pelo INPI nas categorias Identidade IP e DO.  

 

Pois anote: um Relatório do Ministério da Agricultura, Pesca e Alimentação da Espanha sobre a aplicação do regime de autorização de novas plantações de vinhas e o potencial vitícola na Espanha para 2021, relata vários dados interessantes, sendo que um deles é este: 96% da área de vinhedos na Espanha está em territórios com denominação de origem (Identidade Geográfica).

 

Os espanhois levam muito a sério a questão da Identidade Geográfica, e tem cerca de 90 áreas geográficas com Denominação de Origem (D.O.) ou outras certificações, de grande ou de pequeno porte, veja aqui: https://wpconseld.com.br/invinoviajas/2018/03/espanha-investe/

A Espanha tem até mesmo uma associação que congrega 56 Pequenas Denominações de Origem – In Vino Viajas já entrevistou diretores da entidade, veja aqui: https://wpconseld.com.br/invinoviajas/2018/04/exclusivo-conheca-a-rede/ .

 

Além disso, como você sabe, a Espanha é o pais que tem algumas das adegas mais bonitas do mundo, criadas por famosos arquitetos modernos. In Vino Viajas já escreveu sobre tudo isso, veja aqui: https://wpconseld.com.br/invinoviajas/2015/03/conheca-arquitetura-de-j-marino-pascual/  

 

Segundo a Conferência Espanhola de Conselhos Regionais Vitícolas (CECRV), “o consumo de vinhos com Denominação de Origem tem inúmeras vantagens para o consumidor em relação à qualidade e garantias do produto que compra. O selo de uma Denominação de Origem garante o rigoroso controle e certificação dos vinhos protegidos, bem como a rastreabilidade do produto em todas as suas etapas de produção e elaboração. As vinícolas registradas em uma Denominação de Origem comprometem-se a manter a mais alta qualidade possível, bem como a elaborar seus vinhos com as variedades de uvas admitidas em cada território e a Denominação de Origem, preservando a singularidade de cada região vinícola.”

 

Em 2020, foram concedidas autorizações para 4.750 novos hectares de vinhas, 17.688 hectares para replantação e 1.242 hectares para conversão dos antigos direitos de replantação. Em 31 de julho de 2020, o potencial de produção de vinho na Espanha era de 989.279 hectares.

 
O Relatório traz ainda informações adicionais sobre a caracterização do setor, entre as quais se destacam:
 
·      69% das fazendas têm menos de meio hectare e, juntas, têm 6% da vinha, enquanto 4% das fazendas 
têm mais de 10 ha e respondem por 59% da vinha.
·      A percentagem de castas para vinho é mantida em relação à época anterior e corresponde a 52% 
de tintas e 48% de brancas. A superfície restante é uma mistura de variedades.
·      Airén é a casta vinífera que ocupa a maior superfície de Espanha (204.507 ha), mas em declínio. 
É seguida de perto pela variedade Tempranillo (202.253 ha), cuja superfície está em ascensão. 
A área plantada dessas duas variedades se destaca muito acima das demais.
·      As variedades mais plantadas desde 2020 foram Tempranillo e Garnacha Tintorera, 
seguidas de Verdejo e Syrah. Airén, Bobal e Garnacha Tinta são os que mais diminuíram.

 

Brindo a um bom tempranillo.