Por Rogerio Ruschel (*)
Entrevista exclusiva com o Prefeito de Madalena e com o Presidente da CVRAçores sobre os planos da Cidade Portuguesa do Vinho de 2017.
Estimado leitor ou leitora. O território português do Arquipélago dos Açores tem uma origem conturbada e heróica: em uma região do Oceano Atlântico a cerca de 1.700 Km de Lisboa, a erupção de um vulcão fez surgir um amontoado de rochas com alguma terra. Na foto acima, o Museu do Vinho da Ilha do Pico e ao fundo a montanha do Pico, também abaixo.
Ao longo dos séculos as ilhas foram sendo colonizadas e hoje formam a Região Autônoma dos Açores, um conjunto de 9 ilhas e muitas ilhotas com cerca de 250.000 habitantes. A maior e mais populosa delas, a ilha de São Miguel e sua capital, Ponta Delgada, têm pelo menos a metade deste total. E a Ilha do Pico, onde está a montanha do vulcão do Pico, é a segunda maior e o Concelho de Madalena (município) tem cerca de 6.000 habitantes (foto abaixo).
Com uvas trazidas de Creta (Grécia) e da Sicília (Itália) conforme afirmam alguns historiadores, na Ilha do Pico foi implantada uma “indústria de vitivinicultura única no mundo, em solos que desafiam a sua própria definição, porque praticamente só existe rocha e muita pedra amontoada em muros que circundam as videiras para as proteger dos devastadores ventos salinos “, como resume Paulo Machado, presidente da Comissão Vitivinícola Regional dos Açores.
O trabalho com a vitivinicultura feito a partir do ano 1432 nesta ilha já teve vários reconhecimentos, entre os quais destaco dois: em 2004 a Cultura da Vinha da Ilha da Pico foi reconhecida como Patrimônio da Humanidade pela Unesco - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura; e semana passada, Madalena, sua capital, foi eleita como a Cidade Portuguesa do Vinho de 2017 pela Associação Municípios Portugueses do Vinho (AMPV), derrotando outros cinco candidatos: Alenquer + Torres Vedras (Lisboa), Moura (Alentejo), Pinhel (Beira Interior) e Vila Nova de Foz Côa (Douro). Para os brasileiros descendentes de açorianos, especialmente no sul do país, destaco a mensagem do prefeito de Madalena, José António Soares, abaixo: ele informa que pretende promover os Açores no Brasil, especialmente em Santa Catarina.Na foto abaixo as curraletas, organização do solo com muro de pedras basálticas para proteger as videiras. Cada curraleta pode ter entre 6 e 10 videiras.
Para contar esta historia da Ilha do Pico, entrevistei as pessoas responsáveis pelas atividades da Cidade Portuguesa do Vinho de 2017: o prefeito da cidade e o presidente da associação dos produtores de vinho. Espero em breve apresentar a você aspectos do turismo no arquipélago, das tradições culturais e dos vinhos dos Açores, mas agora veja as entrevistas exclusivas que estas lideranças picoenses deram a “In Vino Viajas”.Na foto abaixo a igreja da Lajes do Pico.
Entrevista com José António Soares, presidente do Conselho de Madalena (prefeito)
R. Ruschel: Quais os compromissos assumidos pelo Município de Madalena por ocasião da candidatura, qual a programação planejada?
José António Soares: Ao formalizar a sua candidatura, o Município propôs-se dinamizar uma vasta panóplia de eventos ao longo do ano, que irão fazer da Madalena o principal núcleo da vitivinicultura na região e no país.
Das artes às ciências, dando enfase às singularidades da nossa terra, serão realizadas várias iniciativas destinadas a um público eclético e heterogéneo, abrangendo todas as faixas etárias. Desde a realização de workshops, conferências e tertúlias à apresentação de livros e realização de feiras, dezenas de eventos prometem animar o Município, que viverá o seu momento apoteótico em julho, nas Festas da Madalena, um dos mais importantes festivais açorianos, cuja edição de 2017 será dedicada ao Vinho.
Destaco ainda, a realização da Gala de Abertura da Cidade do Vinho em março, bem como a celebração de diversas efemérides, nomeadamente o Dia Europeu do Enoturismo e a Gala dos 10 anos da Associação de Municípios Portugueses do Vinho, que certamente permitirão refletir sobre o passado, o presente e o futuro do mundo rural e da vitivinicultura, celebrando a nossa mais intrínseca identidade.
R. Ruschel: Qual foi o orçamento apresentado por Madalena para promover-se como Cidade Portuguesa do Vinho 2017?
José António Soares: O orçamento previsto para a realização do evento é de 50 mil Euros. Na foto abaixo, o interior da igreja Santa Maria de Madalena.
R. Ruschel: Como se pretende realizar a promoção da cidade no exterior? Há interesse em promover Madalena e Açores no Brasil? E na América Latina?
José António Soares: A promoção da Madalena, do Pico e dos Açores além-fronteiras é fundamental para a Câmara Municipal, que tem vindo a envidar os seus melhores esforços em prol da afirmação do Município no exterior, sendo os resultados muito positivos, dado o crescimento exponencial do turismo no Concelho e na Ilha.
Neste sentido, a importância da diáspora como veículo de promoção é fundamental, tendo o Brasil um papel central, dada a dimensão e importância da comunidade açoriana aí residente, muito em particular no Sul, no estado de Santa Catarina.
R. Ruschel: Como o Município avalia os benefícios que os Açores e a Madalena poderão obter sendo a Cidade Portuguesa do Vinho em 2017?
José António Soares: A Cidade do Vinho é o evento mais importante da vitivinicultura em Portugal, e irá fazer da Madalena em 2017 o principal núcleo do setor na região e no país.
O evento, que se realiza pela primeira vez nos Açores, irá potenciar de forma incontornável o turismo, o enoturismo e todas as áreas de atividade a montante ou a jusante destes setores, alavancando o tecido empresarial local, e por conseguinte, toda a economia.
Fortalecendo a marca Madalena, Capital dos Açores da Vinha e do Vinho, o evento irá ainda reforçar de forma indelével o vinho como produto estratégico e singular do Concelho, associando-o ao património edificado e natural da Madalena, numa visão multidimensional, projetando o Município e a Ilha além-fronteiras.
R. Ruschel: Qual a entidade ou organização dos Açores responsável pela proteção e gestão do Património da Humanidade?
José António Soares: A Direção Regional do Ambiente e o Parque Natural da Ilha do Pico são as entidades responsáveis pela proteção e gestão da Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico, Património da Humanidade.
Entrevista com Paulo Machado, presidente da Comissão Vitivinícola Regional dos Açores
R. Ruschel: Qual foi a participação da CVRAçores no projeto? E como vai apoiar na realização dos eventos?
Paulo Machado: A CVRAçores colaborou como parceiro no projeto, disponibilizando informações e dados importantes para reforçar e fortalecer a candidatura. Nos eventos que se realizarão em 2017 a CVRAçores deverá apoiar as ações dedicadas à promoção dos vinhos certificados, nomeadamente feiras, concursos, debates, provas temáticas e dentro do seu campo de atuação, canalizar recursos para divulgar a Capital do Vinho dentro e fora da região.
R. Ruschel: Qual foi a participação da CVRAçores no projeto? E como vai apoiar na realização dos eventos?
Paulo Machado: A CVRAçores colaborou como parceiro no projeto, disponibilizando informações e dados importantes para reforçar e fortalecer a candidatura. Nos eventos que se realizarão em 2017 a CVRAçores deverá apoiar as ações dedicadas à promoção dos vinhos certificados, nomeadamente feiras, concursos, debates, provas temáticas e dentro do seu campo de atuação, canalizar recursos para divulgar a Capital do Vinho dentro e fora da região.
R. Ruschel: Como a CVRA e/ou o Concelho avalia os benefícios que Madalena e os Açores poderão obter sendo a Cidade Portuguesa do Vinho 2017?
Paulo Machado: No entender da CVRAçores esta é uma oportunidade excelente para dinamizar e dar a conhecer ao país e ao mundo uma das mais singulares construções humanas ligadas à prática vitícola. O aumento do número de visitantes que se deslocarão ao Pico para conhecer a Cidade Portuguesa do Vinho trará dividendos diretos para os produtores de vinho, aumentando o reconhecimento dos vinhos locais, mas também para toda a indústria turística já instalada que concilia história, cultura, património, vulcanismo e diversas atividades marítimas.
Socialmente será muito importante, permitindo o reforço de uma identidade muito própria da população local, que tem uma ligação muito estreita com o vinho. Poucas regiões no mundo tem uma cultura vínica tão enraizada como aqui. Praticamente todas as famílias produzem uvas e vinhos pelo menos para autoconsumo e fazem das suas pequenas adegas o espaço primordial para receber e festejar com os seus amigos. Para a indústria vitivinícola local será a confirmação do excelente trabalho realizado nos últimos anos com forte investimento na melhoria da qualidade dos vinhos e no aproveitamento das especificidades locais (castas únicas, solos vulcânicos, clima marcadamente marítimo e imprevisível).
R. Ruschel: Qual o legado que a CVRAçores estima que vai ficar para a
comunidade?
Paulo
Machado: Acima de tudo ficará o fortalecimento da identidade
de um povo que sobreviveu e criou riqueza em torno da indústria do vinho.
R. Ruschel:
Como os produtores conciliam a produção de uvas (490 hectares) com as áreas
classificadas pela Unesco na Ilha do Pico
Paulo
Machado: A maioria da área em produção encontra-se dentro da
zona classificada pela UNESCO, por também ser esta a de maior potencial
vitícola e onde as uvas atingem melhor qualidade. As intervenções do homem são
muito semelhantes às realizadas pelos primeiros viticultores 500 anos atrás,
pois é impossível a mecanização. É um modo de cultivo ancestral, perpetuado ao
longo de gerações.
Os viticultores respeitam muito o património que lhes
foi legado e não havendo muitas possibilidades de intervir de forma diferente,
acreditam que esta é a melhor forma de produzir uvas e resistir às adversidades
climáticas. Na foto abaixo alguns dos vinhos dos Açores.
R. Ruschel:
Como a denominação de Patrimonio da Humanidade pela Unesco agrega valor aos
vinhos dos Açores?
Paulo
Machado: A classificação da Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha da Pico
como Património da Humanidade é o reconhecimento de uma viticultura única no
mundo, em solos que desafiam a sua própria definição, porque praticamente só
existe rocha e muita pedra amontoada em muros que
circundam as videiras para as proteger dos devastadores ventos salinos. Nestas
condições as produtividades são muito baixas embora os vinhos tenham
características únicas (salinos, minerais e muito frescos) que os tornam
inigualáveis e de grande qualidade.
Poder em cada garrafa transmitir uma história heroica
de sobrevivência e transformação de um terreno inóspito e improdutivo em fonte
de riqueza, que é reconhecida pela UNESCO, é uma enorme valorização para os
vinhos do Pico.
Saiba mais sobre o Cella Bar dos Açores em http://invinoviajas.blogspot.com.br/2015/11/conheca-o-cella-bar-o-belissimo-wine.html
Saiba mais sobre os vinhos dos Açores em http://www.cvracores.pt/
Rogerio Ruschel (*) publica este blog em São Paulo, Brasil, e sempre sonha em conhecer a Ilha de Pico e outros rincões da cultura do vinho reconhecidos como Patrimônio da Humanidade pela Unesco.
Boa noite, achei bastante interessante o seu artigo, mas permita-me "corrigir" alguns aspectos. A Madalena é uma vila e não uma cidade. A Ilha do Pico é composta por três concelhos (Vilas), nomeadamente, Madalena, Lajes e São Roque. Por outro lado, existem algumas fotografias apresentadas que pertencem ao Pico mas não estão no concelho da Madalena.
ResponderExcluirParabéns e obrigado pela partilha de informação sobre esta ilha maravilhosa que é o Pico.
Obrigado pelas correções Alvaro. Meu compromisso é com a qualidade da informação e agradeço sua ajuda. Abraços
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