Por Juliana Winkel (*)
Exclusivo para In Vino Viajas - Ao se afastar um pouco do centro de Roma, na direção sudeste, de
repente se vê a paisagem mudar. As ruas movimentadas dão lugar a vielas
estreitas que convidam aos morros vizinhos. A subida não decepciona: em
minutos, a paisagem passa a mostrar centenas de videiras a perder de vista: são
as ruas de uvas, nas colinas de Alba, em uma região denominada de Castelli
Romani onde estão 15 comunidades como Frascati, Castel Gandolfo, Marino e Rocca
di Pappa. Demarcada pelas colinas Albanesas, a região tem origem vulcânica e é
muito bonita – veja foto acima.
Estamos nos aproximando de Frascati, cidade vizinha à capital do país,
que empresta seu nome ao vinho típico da região – e um dos mais tradicionais da
Itália. O sabor e aroma peculiares dos vinhos Frascati, considerados ideais
para pratos leves como saladas ou frutos do mar, têm origem no solo vulcânico
aliado ao clima mediterrâneo, levemente mais frio que o da capital. Acima, um pouco do bucólico do campo; abaixo, Veja
uma vista da vila de Frascati e a mansão Aldobrandini, na praça central, uma
das atrações turísticas da cidade.
A história de Frascati remonta à época antiga e sua arquitetura nos
faz sentir de volta a um burgo medieval. Bem antes disso, séculos atrás, os
tonéis de vinho eram processados e armazenados em cavernas escavadas na rocha
vulcânica, que lhes garantia a temperatura ideal. Hoje, o local é usado para
turismo histórico e para produções de TV e cinema como esta foto abaixo, da
Tenuta di Pietra Porzia.
Bem ao lado de Frascati, em 493 a.C., foi travada a célebre batalha do
Lago Regilo, responsável pela trégua na rivalidade entre a República Romana e
outros povos latinos – e durante a qual os romanos teriam contato com a ajuda
dos deuses Castor e Pólux, vindos do Olimpo para assegurar sua vitória. Abaixo os jardins da Villa Lancelotti em
Frascati, outra atração turística.
Lendas à parte, no seu entorno, está a atividade agrícola responsável
por sua fama dentro e fora do país: os vinhos feitos com as uvas Malvasia di
Candia, Trebbiano, Greco e Malvasia del Lazio – muitas delas antigas, como a da
foto abaixo.
Há mais de 3 mil anos a região é responsável pelo abastecimento
vinícola da capital e contrasta, com sua rotina agrícola, a efervescência da
cidade. Ali o dia começa por volta das cinco horas da manhã, para que se tenha
tempo de colher as uvas antes do período de maior calor, que no verão pode
chegar a 37º Celsius.
Por volta das 11 horas, já é preciso ter a colheita pronta para o
processamento do vinho. “Tudo é realizado no horário e clima certos”, explica Michele
Russo (foto abaixo), enólogo de uma das fazendas produtoras da região. a Tenuta di Pietra Porzia. “Dessa
forma conseguimos manter o padrão de qualidade sem aditivos químicos”.
O cuidado na produção do Frascati, porém, que já viveu momentos de
instabilidade. Embora tenha longa história nas montanhas do Lácio, a cidade viu
sua reputação vinícola decair há cerca de uma década, devido ao aumento da
demanda internacional. “Tentando atender ao mercado, muitos produtores buscaram
aproveitar a ‘fama’ aumentando a produção sem o devido planejamento, o que influiu
na qualidade”, explica Russo. “Atualmente, estamos voltando às origens do
vinho. É claro que não podemos mais fazer tudo artesanalmente, como há séculos
– mas respeitamos o ritmo das vinícolas e temos cerca de 30 pessoas trabalhando
em todo o processo, a maior parte delas da própria região.” Veja abaixo os
tonéis de aço para produção de Frascati da Tenuta di Pietra Porzia.
Hoje, diz ele, a venda da produção é dividida igualmente entre o
mercado nacional e internacional. “Temos grandes clientes no Japão e China”,
comenta. “Existe muito interesse dos chamados ‘mercados emergentes’ pelos
produtos tradicionais”. Embora positivos para a produção vinícola, os novos
tempos de desenvolvimento também oferecem seus desafios. Um deles é a
especulação imobiliária motivada pelo crescimento urbano, que ameaça o espaço
essencial para o cultivo de uvas.
Outro tem a ver com a mudança de interesse das novas gerações pelo
trabalho no campo – um setor que Russo vê, inclusive, como potencial solução
para a crise econômica enfrentada pelo país. “Seria importante um maior
investimento em conhecimento do trabalho agrícola e nas técnicas de produção do
vinho, para que não enfrentemos escassez de mão-de-obra no futuro”. Veja abaixo
o selo de garantia da origem Frascati.
A própria instabilidade econômica também influencia a dinâmica da
produção. “Até alguns anos atrás, fechávamos contratos de
fornecimento de vinhos com validade de 5 ou 10 anos. Agora os contratos são
firmados anualmente, o que nos assegura o escoamento da safra atual, mas não
nos dá garantias sobre as próximas”, afirma. Apesar disso, segundo ele, a
produção de vinhos Frascati continua se esgotando a cada estação, sem perdas. O
que significa que seu prestígio continua em alta – e que, provavelmente, os
sabores do Lácio continuarão encontrando lugar nas mesas do mundo – como os da
foto abaixo que podem ser encontrados no Brasil.
Apenas como curiosidade: o European Space Agency (ESA) ou Instituto Europeu de Investigação
Espacial (ESRIN), uma das unidades de pesquisa da Agência Espacial Europeia
fica em Frascati. As suas responsabilidades incluem o recolhimento, o
armazenamento e a distribuição dos dados de satélite aos parceiros da ESA (20
países europeus e alguns observadores) e funciona como centro de tecnologia de informação da
Agência.
(*) Juliana Winkel é jornalista especializada em redação e produção de
conteúdo, tendo passado por publicações voltadas à educação, cultura, meio
ambiente e terceiro setor. Atualmente vive em Roma, na Itália, de onde colabora
para publicações e organizações no Brasil. Imagens de Juliana Winkel, da Tenuta
di Pietra Porzia ou arquivo do editor.
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