Para reagir às mudanças climáticas (veja http://invinoviajas.blogspot.com.br/2014/01/os-impactos-do-rechauffement-de-la.html)
muitos viticultores e vinicultores estão investindo em Agricultura Racional,
Cultura Biológica ou Orgânica, principios de Biodinâmica e vinhos Naturais. A idéia é proteger e enriquecer a
vida do terroir, porque o solo tem uma grande quantidade de formas de vida e
tudo tem que ser harmônico (foto acima, algumas das 3.000 espécies de uvas, e abaixo, de
Pascal Marchand).
Temos vinhos assim no mercado há mais de 30 anos e a produção de
vinhos mais ecológicos vem crescendo com regularidade, embora ainda signifique muito
pouco, menos de 5% do total mundial. A Enoteca Saint Vin Saint, na Vila Nova
Conceição, em São Paulo (veja abaixo, a chef Lis Cereja), tem um menu somente com vinhos orgânicos
e biodinâmicos que harmonizam muito bem com as comidinhas interessantes da
casa.
O crescimento é lento, mas definitivo. Em uma
entrevista publicada no “El Correo del Vino”, da Espanha, a viticultora Pilar Higuero repondeu a uma
entrevista da escritora
Mar Galván que “El
cambio climático no es futuro, es presente. No sé cómo verán las cosas otros
agricultores, pero, con respecto a la viticultura, cada vez son más los que se
acercan a esta forma de trabajo, buscando sostenibilidad y una mayor calidad en
sus vinos.” Pilar Higuero é viticultora, criadora de vinhos como o Pita Cega (foto
abaixo - foto dela mesma) do Lagar de Sabariz, da Galicia,
uma das mais badalados bodegas com práticas biodinâmicas da Europa.
O
crescimento é definitivo, mas é arriscado. Nicolas Joly, produtor do premiado vinho
branco Coulée de Serrant, em Savennières, Pays-de-Loire, França, e autor de livros
considerados fundamentais sobre o assunto, diz que de vez em quando é
ridicularizado por adotar práticas semi-esotéricas da biodinâmica – como deixar
o “mato” crescer no vinhedo, foto abaixo. E complementa: “Praticar a
biodinâmica significa também aceitar a familiaridade com outra linguagem, com
outros métodos e presenciar, durante os primeiros anos, uma queda de produção
ou um risco maior de doença. A reconversão não afeta unicamente a propriedade
agrícola, mas também o indivíduo cuja motivação deveria ir além de simples
objetivos comerciais.”
A existência de legislação específica é um dos fatores que pode
acelerar este processo. Paises europeus e outros produtores de vinho do chamado
Novo Mundo como os Estados Unidos, Chile, Austrália e África do Sul já tem
normas específicas sobre vinicultura orgânica e paises como Argentina, Uruguai,
Espanha e França já tem bons produtos nestes segmentos – com vinhos tintos,
brancos e rosé.
As feiras especializadas estão ficando importantes, como a espanhola FIVE – Feria Internacional del Vino Ecológico, que vai ter sua 4a.
edição realizada em Pamplona, Espanha, em maio de 2014 e
a Bio 2014 Vintage (Millésime bio
2014 em francês), o maior evento de vinhos orgânicos do mundo, cuja mais recente edição, no fim de janeiro de 2014, reuniu mais de 780 expositores, produtores ou compradores de 12 países
na Europa, América do Sul e África na cidade francesa de Montpellier.
Aliás, na Europa muitos
produtores estão certificando até mesmo o processo de gestão das vinícolas, de
acordo com a Norma UNE166002
ou outras.
No Brasil ainda não temos nenhum legislação específica (para
vinhos). Segundo consta são
poucos os produtores orgânicos certificados no país e tínhamos até o ano
passado apenas um pequeno produtor de vinho biodinâmico brasileiro, a Vinícola Santa Augusta, de Videira, na Serra
Catarinense, que colhe uvas a 1.290 metros de altitude (foto abaixo) para
produzir o vinho Imortali – empresa, aliás, de duas mulheres.
É em Santa Catarina também, na Praia do Rosa, Imbituba, que a
Dominio Vicari, pequeno produtor brasileiro de vinhos naturais também liderado
por uma mulher, Lili Vicari (foto abaixo), vem obtendo reconhecimento para seu Riesling
itálico e o Merlot, produzidos com uvas que vêm de Monte Belo, na serra gaúcha.
Conheça um pouco sobre estes conceitos.
Agricultura
Racional: É uma espécie de primeiro
estágio, no qual todos os produtos químicos são banidos até o limite máximo.
Normalmente se faz o possível para que a agricultura seja 100% natural, mas no
caso de possível perda de colheita as atitudes são tomadas com
responsabilidade. Leva-se em conta que alguns lugares não permitem uma
cultura 100% natural, por problemas climáticos ou mesmo da terra. Veja abaixo foto do vinhedo com um lago no Lagar
de Sabariz, agricultura racional e biodinâmica.
Cultura
Biológica ou Orgânica: Na agricultura orgânica, a ênfase está em manter um solo saudável
e biologicamente ativo. Nos vinhedos isso significa o uso de culturas de
cobertura em vez de herbicidas, e fertilizantes naturais, como esterco, em vez
de artificiais. Na maioria dos países os vinhos produzidos a partir de uvas
ecológicas, biológicas e orgânicas são exatamente a mesma coisa. A viticultura
orgânica foi legalmente reconhecida na França em 1981; conhecida como
"Agriculture Biologique". É a mais enquadrada em termos de legislação e
utiliza os princípios de que a natureza cria as doenças e os remédios. O segredo da agricultura orgânica está no tratamento da uva, que
chega até o momento da colheita sem ter recebido produtos químicos. A produção de vinhos ecológicos passou a ter uma norma única e
exclusiva para todos os paises europeus a partir da colheita de 2012.
Biodinâmica: Para muitas pessoas isto está na fronteira entre o misticismo
e a agricultura, mas o fato é que os principais vinhos produzidos com
principios biodinâmicos estão entre rótulos de grande valor comercial, como
grandes Bordeaux. A biodinâmica nasceu nos estudos do austríaco Rudolf Steiner
divulgados entre 1894 e os anos 1920. Segundo seu livro "The Spiritual Foundations of Biodynamic Methods" o
cuidado, tanto na vinha quanto na adega, é regido pela posição dos planetas e
principalmente pelas fases da lua. A utilização de produtos agroquímicos e fertilizantes é
absolutamente proibida, mas algumas misturas (conhecidas como preparos
biodinâmicos) são permitidas. Como a terra está ligada aos outros elementos da natureza, o
fogo, a água e o ar, o trabalho no vinhedo é feito seguindo ciclos lunares, e
todo o meio ambiente em volta é rigorosamente tratado para que o ecossistema
esteja em harmonia. As vinhas são vistas realmente como um organismo vivo.
Vinho Natural: é similar à Cultura Biológica ou orgânica, da
qual se diferencia por não usar sulfito para conservar os vinhos. Na
verdade os produtores de vinhos naturais pregam, além da
cultura orgânica nas vinhas, que todo o processo de fermentação seja baseado
somente no suco da uva, sem nenhuma interferência humana. E só utilizam
sulfitos na hora de engarrafar seus fermentados - principalmente para aumentar a resistência no transporte -
e sempre em quantidades muito pequenas, que praticamente desaparecem no produto
final. Não existem certificações oficiais para esse tipo de produção.
(*) Rogerio Ruschel é jornalista, enófilo e consultor
especializado em sustentabilidade socioambiental.
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