Por Rogerio Ruschel (*)
Como sou
seu amigo, vou sugerir uma coisa: se um dia você tiver a oportunidade de
visitar Castilla-La Mancha, liberte o Don Quixote que tem dentro de você.
Castilla-La Mancha - a terra de Don Quixote e seu escudeiro Sancho Pança, abaixo
- parece que
só revela integralmente seu imenso patrimônio cultural, riqueza popular e
paisagens se você tiver a coragem de passar um tempinho meio “sem rumo”, se
você for um quixotesco sonhador.
Cenas inesquecíveis vão surpreender você, como vêm surpreendendo os Sanchos Panças desde que
este “nasceu” com Quixote em 1605, pela caneta de Miguel de Cervantes, tais como um por-de-sol inesquecível
com moinhos de vento na cidade de Mota del Cuervo, Provincia de
Cuenca (foto bem acima) ou na chegada à pequena cidade de Bogarra (foto abaixo - e acredite: sem retoques!) na
Provincia de Albacete, que tem 1.009 moradores e forte influência árabe.
Como se isso não fosse suficiente, Castilla-La Mancha é o
território que tem o maior plantio de uvas do mundo, com cerca de 200.000
hectares de vinhedos. A região é responsável por uma produção média anual de 21
milhões de hectolitros de vinho, cerca de 53% da produção espanhola de vinhos.
Na verdade a região é o celeiro agrícola da Espanha - é também a
maior produtora de cevada, trigo e outros produtos espanhóis. Neste ambiente
você poderá encontrar cenas belissimas como esta curva de estrada, abaixo, perto da comunidade de
Maldonado Jorquera, com apenas 450 moradores, também na Provincia de Albacete.
Estes
200.000 hectares de vinhedos estão na região central da Espanha e da Peninsula
Ibérica distribuídos entre as Provincias de Albacete, Ciudad Real, Cuenca,
Guadalajara e Toledo. Todo este vinho está organizado em nove Denominações de
Origem (D.O. - Valdepeñas, Méntrida, La Mancha, Manchuela, Jumilla, Mondéjar,
Uclés, Ribera del Júcar y Almansa), uma Indicação Geográfica Protegida (I.G.P.
- Vinos de la Tierra de Castilla) e uma marca colectiva (Cueva). Veja esta
região bem no centro do mapa abaixo, perto de Madrid.
Além das
nove D.O.s e da I.G.P. existem oito parcelas vinícolas - em espanhol “pagos”.
Explico: a legislação espanhola permite que o nome de um “pago vitícola”,
que é a relação da finca (a parte agrícola) com a bodega (a parte industrial)
seja considerada uma D.O. se forem respeitadas determinadas condições, entre as
quais um alto grau de qualidade. De qualquer maneira, com ou sem certificação
de origem, os parreiras convivem com paisagens belíssimas, como mostra esta
foto primaveril de Las Pedroñeras, em Cuenca.
Os vinhos
são produzidos há milhares de anos com uvas regionais, mas também com variedades
internacionais; as castas aceitas pela D.O. La Mancha, por exemplo, são a
Tempranillo (ou Cenibell), Garnacha e Moravia e as clássicas Cabernet
Sauvignon, Merlot e Suyrah (tintas) e Airén e Macabeo com Chardonnay e
Sauvignon Blanc entre as uvas brancas. Já para a D.O. Valdepeñas são aceitas
também as uvas Verdejo, Moscatel e Petir Verdot, e para a D.O. Manchuela são
aceitas também uvas regionais como Bobal, Monastrell, Moravia Dulce e Albillo.
(Abaixo, o Parque Arqueológico de Segóbriga Saelices, em Cuenca, considerada
uma das cidades romanas mais bem conservadas da Espanha).
Toledo é a capital de
Castilla-La Mancha e é também talvez a mais turística; chamada de cidade das
tres culturas pela coexistência de patrimônio arquitetônico de judeus, cristãos
e muçulmanos, foi declarada Patrimônio da Humanidade pela UNESCO en 1986.
Outra cidade histórica que
também é Patrimônio da Humanidade (desde 1996) é a fortificada Cuenca,
construída pelos mouros para defender o território do Califado de Córdoba.
Por estas e outras razões, a região
de Castilla-La Mancha recebe muitos visitantes: em 2010 foram mais de 11,4 milhões de turistas, dos
quais cerca de 2 milhões eram estrangeiros. Destes
turistas 63,5% são atraidos por
Turismo Patrimonial e Cultural, 50,5% por Turismo de Natureza e Rural
e cerca de 37,6% tem como foco principal o Turismo Enogastronômico. Existem duas grandes Rotas de Vinho, formadas por muitas outras: a
Rota “Caminos del Vino” e a “Rota de Jumilla”, que adentra também a região da
Múrcia. O mosteiro de Uclés, apelidado de “El Escorial de la Mancha"
(abaixo), é uma das atrações da região.
A Rota Caminos del Vino
inclui centenas de bodegas em oito comunidades (Alcázar de San Juan – local onde foi tirada a foto noturna dos moinhos
de vento, abaixo - Pedro Muñoz, Socuéllamos, Tomelloso, Villarrobledo, Campo
de Criptana, El Toboso e San Clemente). A Rota e a região tem cultura vitivinícola de milhares de anos e um patrimonio artístico e paisagístico
com identidade própria: longos campos que parecem não ter fim, cobertos por
vinhedos e outros plantios agricolas, ponteado por alguns bosques e parques
naturais. A outra rota de vinhos, a “Rota de Jumilla” fica a noroeste da
região de Múrcia, encravada entre la Mancha, Andalucía e Valencia.
Embora o
grande movimento turístico espanhol (e europeu, de maneira geral) seja no verão
(junho/julho/agosto) e o maior movimento do turismo relacionado ao vinho aconteça
durante a vindima (setembro/outubro), monumentos e atrações turisticas estão
disponíveis o ano inteiro. Entre os museus, por exemplo, você pode visitar o
Museu do Vino de Valdepeñas, único deste tipo em Castilla-La Mancha; o Museu da
Cuchillería, em Albacete; o Museu López Villaseñor em Ciudad Real;
prédios com forte herança árabe em Guadalajara e Cuenca e quase que uma cidade
inteira em Toledo, com destaque para as colossais igrejas, o Museo de Santa
Cruz, o Museu Nacional de Arte Hispanojudío y Sefardí e o Museo del Greco. Para
encerrar, abaixo uma foto do Parque Nacional de las Tablas, em Ciudad Real.
Pois é: visto isso proponho um brinde à liberdade do sonhador Don
Quixote que está dentro de você. E de mim.
(*) Rogerio Ruschel é jornalista e enófilo e já soltou seu Don Quixote
em Toledo e em uma parte de Castilla-La
Mancha. As fotos foram obtidas em serviços de divulgação de órgãos espanhóis oficiais.
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