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sábado, 19 de dezembro de 2020

Chile e Argentina trabalham para implantar a mais longa rota de enoturismo do mundo, com 1.300 kms


Por Rogerio Ruschel

 

Meu prezado leitor ou leitora, parece que a América do Sul vai ganhar um atrativo enoturístico gigantesco: uma rota que se propõe a ser a maior do mundo, com 1.300 quilometros entre o sul do Chile e o noroeste da Argentina e deve incluir mais de 170 vinícolas. Vai ser bom quando estiver pronta e já for possivel viajar pelo mundo pós-pandemia.

 

O roteiro visa reviver a façanha que a travessia da Cordilheira dos Andes e o patrimônio gerado pela indústria do vinho significaram na época da conquista espanhola. O projeto conta com o apoio de diversas organizações do Chile e da Argentina, das áreas de vinicultura, cultura e turismo, além da simpatoa de organizações internacionais de enoturismo. A região é importante produtora de frutas, de pisco, e tem fama de ter uma “energia mágica”.

 

A rota enoturística vai atravessar paisagens montanhosas e apresentar um patrimônio histórico-cultural praticamente desconhecido ao longo de 1.300 kms entre a região de Coquimbo e quatro províncias da Argentina. Segundo consta, o roteiro vai resgatar parte da história do vinho de ambas as nações, os antecedentes que mostram as origens da viticultura no Chile, Argentina e Cone Sul.

 

Durante a conquista espanhola, Francisco de Aguirre e o clérigo Juan Cidrón, ligaram os oceanos Pacífico e Atlântico por meio de uma rota comercial. Franciso de Aguirre foi governador da provincial de Tucumán de 1553 a 1554 e fundador e primeiro prefeito de Santiago de La Nueva Extremadura em março de 1541, atual Santiago do Chile.

 

Essa rota comercial no sul do Chile deu vida às primeiras cidades do país transandino e também gerou um próspero intercâmbio comercial, tecnológico e cultural que com o passar do tempo não traria apenas a vinha, o vinho e o álcool da região de Coquimbo (capital da Provincia de Elqui, no Chile) para a Argentina e o Alto Peru (Potosí) mas também criariam uma surpreendente rede de estradas, diversidade cultural em torno da agricultura, pecuária, arte, mineração, religião e turismo.

 


 

Depois de uma longa investigação, em 2018 foram iniciados os contatos entre profissionais chilenos e a Subsecretaria de Turismo de Santiago del Estero. O projeto rapidamente ganhou força e uniões de turismo (Câmara de Turismo da Região de Coquimbo, Inprotur, Organização Mundial de Turismo Eno), universidades (Santo Tomás) e instituições estaduais (Corporação de Desenvolvimento Produtivo Regional, Município de La Serena e Sernatur) aderiram. Além disso, até o momento 170 vinícolas de ambos os países embarcaram na iniciativa.

 

O objetivo é poder recriar aquela viagem, feita primeiro por espanhóis e indígenas, e mantida viva hoje por artilheiros e aventureiros, através do Vale do Elqui (foto acima), cruzando o passo Água Negra e depois entrando nas quatro províncias argentinas de San Juan, La Rioja, Catamarca e Santiago del Estero.

 

O historiador e doutor em Estudos Latino-americanos da USACH, Pablo Lacoste, diz sobre o projeto que “temos vinhedos patrimoniais que se distinguem dos da Argentina central e do Chile central. Também a forte presença de pequenos viticultores, não teremos as grandes áreas de cultivo das empresas concentram-se na área central das duas paisagens. E temos paisagens culturais homogêneas com arquitetura em terra crua, paredes de pedra e taipa, um patrimônio religioso que tem se mantido muito bem, uma cultura do tropeiro e da pequena pecuária."

Os atrativos são muitos, não só na visita às vinhas, mas também igrejas, moinhos, alambiques, fossos, estradas, socalcos, cidadelas e fortalezas indígenas, paisagens naturais surpreendentes, um vasto património histórico, arquitectónico e cultural associado a esta indústria.

 

Brindo a isso.

 

Estudo de Harvard com 210 mil norte-americanos por 30 anos garante: o vinho é um dos alimentos “mais amigos” do coração

 Por Rogerio Ruschel

Estimado leitor ou leitora, fico feliz em poder divulgar a conclusão de pesquisas da Universidade de Harvard sobre como o consumo equilibrado de vinho faz bem para o coração. Isso já havia sido mostrado por outros estudos, mas este agora é o pai de todos os estudos por seu alcance e prestígio. E lamento ter que informar que o consumo de carne e carboidratos refinados pode aumentar os riscos cardiovasculares. Enfim, acho que não se pode ter tudo ao mesmo tempo…

Então anote: beber vinho, café e comer vegetais com folhas verdes pode ser a chave para ter um coração saudável, de acordo com as descobertas de uma nova pesquisa, pioneira no estudo do impacto dos alimentos saudáveis ​​nos alimentos. Pesquisadores da Harvard T.H. Chan School of Public Health, unidade da Universidade de Harvard, estudou mais de 30 anos de dados dietéticos de um total de 210.145 americanos, com o objetivo de avaliar o quanto certos alimentos influenciam os riscos de doenças cardíacas e derrames. O resultado foi publicado em novembro de 2020 no Journal of the American College of Cardiology.

Eles descobriram que uma dieta rica em ingredientes pró-inflamatórios, como carnes processadas e carboidratos refinados (pão, pãezinhos, doces, massas, arroz branco, açúcar, sucos, bebidas doces ...), poderia aumentar o risco em 46% de doenças cardíacas e em 28% de acidentes vasculares cerebrais.

Pelo contrário, o estudo revelou que os participantes que comeram muitos alimentos antiinflamatórios tiveram um risco menor de desenvolver doenças cardíacas. Especificamente, o estudo cita alimentos como vegetais de folhas verdes, vegetais laranja e amarelo, grãos inteiros, café, chá e vinho tinto; todos ricos em antioxidantes e vitaminas essenciais para os benefícios da saúde.

Este estudo, liderado pelo Dr. Jun Li, é o único no qual os pesquisadores analisaram o impacto cumulativo dos alimentos pró-inflamatórios no risco de doenças cardíacas; em outras palavras: por que alguns alimentos são mais prejudiciais à saúde cardíaca no longo prazo do que outros. Na verdade o estudo está entre os primeiros a vincular um índice inflamatório alimentar (baseado em alimentos) a um risco de doença a longo prazo cardiovascular.

Depois de controlar os fatores de estilo de vida, eles descobriram que as pessoas que comiam alimentos ou bebidas processadas eram mais propensas a ter ataques cardíacos ou desenvolver doenças cardíacas durante o estudo. Todos esses grupos de alimentos estão ligados a biomarcadores que indicam inflamação e estresse no corpo.

Meu caro amigo ou amiga, infelizmente gosto de carne, pães, massas e doces, mas Se quiser detalhes, procure “Dietary Inflammatory Potential and Risk of Cardiovascular Disease Among Men and Women in the U.S.” - https://www.jacc.org/doi/10.1016/j.jacc.2020.09.535

Terra Indígena Andirá-Marau é a primeira Indicação Geográfica para povos indígenas do Brasil - do Waraná, o guaraná mágico dos Sateré-Mawé


Por Rogerio Ruschel

Prezado amigo ou amiga, vamos fazer uma pequena viagem ao coração da floresta amazônica para ver como a identidade agrega valor a um produto. A Terra Indígena Andirá-Marau, com 8.000 Km2, localizada na divisa dos estados do Amazonas e do Pará, conquistou a primeira Indicação Geográfica (IG) de Origem concedida a um povo indígena brasileiro, em razão de dois produtos locais: o waraná (guaraná nativo) e o pão de waraná (bastão de guaraná).

Pois o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual (INPI) reconheceu no dia 20 de outubro de 2020 a Terra Indígena Andirá-Marau como Indicação Geográfica (IG), na espécie Denominação de Origem, para estes dois produtos, porque ficou provado que o waraná, como é chamado pelos indios Sateré-Mawé, ou guaraná nativo, apresenta características únicas devido ao bioma local e o “saber-fazer” do povo indígena com seu modo próprio de cultivo e obtenção do produto.

O guaraná/waraná é uma planta mítica, mágica, muito importante para o povo Sateré-Mawé, uma comunidade étnica com cerca de 13.000 moradores e 200 famílias produtoras do waraná. Representante do Consórcio de Produtores Sateré-Mawé (CPSM), Obadias Batista Garcia diz que “Para nós, o guaraná é uma palavra que significa princípio de sabedoria, é a nossa cultura e educação. A sabedoria e o reconhecimento de como ser um grande líder é repassado por meio do guaraná ao longo de gerações. É no guaraná que está todo o conhecimento do povo Sateré-Mawé”.

Débora Gomide Santiago, coordenadora de Indicação Geográfica de Produtos Agropecuários do Mapa - Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, “Foram mais de dez anos de apoio do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento no processo de estruturação da indicação geográfica. Além de ser um reconhecimento importantíssimo para o povo indígena Sateré-Mawé, pela sua história de domesticação da planta do guaraná e produção única, que guarda cultura, tradição e saber-fazer, é uma conquista de todo o país. Trata-se de um produto 100% brasileiro, reflexo da riqueza do nosso povo, da nossa tradição e da nossa biodiversidade”.

O Mapa atuou ao menos em quatro vertentes no processo de estruturação da indicação geográfica: identificação dos potenciais da região, contratação de consultoria, em parceria com a FAO, para desenvolvimento de ações de sensibilização, emissão de instrumento oficial para delimitação de área e forneceu suporte aos indígenas em relação ao pedido de registro no INPI.

A meta da Denominação de Origem também foi perseguida pela Fundação Slow Food para a Biodiversidade. “Acreditamos no waraná desde o início dos anos 2000”, lembra Serena Milano, secretária-geral, informando que desde 2002 a organização criou a Fortaleza Slow Food.  “Conseguir a Denominação de Origem significa certificar que o produto, cujas características específicas se devem a fatores humanos e naturais, existe apenas naquele meio geográfico específico”, explica Maurizio Fraboni, economista social de desenvolvimento que, há 25 anos, trabalha ao lado dos Sateré-Mawé. “No caso do waraná, no entanto, há muito mais do que isso: a bacia hidrográfica formada pelos rios Andirá e Marau é o banco genético do guaraná, o único no mundo. Um santuário ecológico e cultural construído ao longo dos séculos”.

Durante o último século, o guaraná foi ficando conhecido em diversas regiões do Brasil;, graças a seu sucesso comercial. Com isso a indústria agroalimentar começou a impor a muitos produtores o cultivo fora da terra indígena e o uso exclusivo de cultivares obtidas por clonagem. Ou seja, a industrialização maciça do guaraná descaracterizou a matéria-prima. “A Denominação de Origem do waraná é o reconhecimento de décadas de lutas pela defesa de um produto que não deve ser considerado mera mercadoria”, explica Maurizio Fraboni.

O cultivo do guaraná nativo é feito de forma artesanal pelos produtores, que desidratam e defumam os grãos resultando no bastão de guaraná com cor, aroma, sabor e consistência únicos. Além disso, os guaranazais não podem ser reproduzidos por meio de clonagem na região delimitada. Os membros da comunidade indígena coletam as mudas nascidas das sementes caídas ao pé dos cipós e as transplantam em clareiras onde crescem como arbustos, tornando-se produtivas. De acordo com o INPI, o método adotado pelos Sateré-Mawé garante a conservação e a adaptação genética do guaraná em seu ambiente natural, com a Terra Indígena Andirá-Marau se constituindo no único banco genético in situ do guaraná existente no mundo.

O reconhecimento da Denominação de Origem do waraná da terra indígena Andirá-Marau vai ser importate também para agregar vaor ao produto que já é comercializado na Europa, pela empresa parisiense Guayapi, especializada em produtos étnicos e pelo Salão do Gusto Terra Madre, do Slow Food. Uma caixa do produto é vendida por cerca de 68,50 Euros.

Indicações Geográficas Brasileiras

A Indicação Geográfica (IG) serve para apontar a origem geográfica para um produto ou serviço. É conferida a produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, que detêm valor intrínseco, identidade própria, o que os distingue dos similares disponíveis no mercado. Com isso, a IG ajuda a combater a usurpação e uso indevido do nome por terceiros não legitimados e pode contribuir para a agregação de valor econômico ao bem ou serviço. Somente os produtores e prestadores de serviços estabelecidos no respectivo território, geralmente entidades representativas, podem usar a IG. 



O Brasil conta com 72 Indicações Geográficas (IGs) nacionais registradas, sendo 58 na espécie Indicação de Procedência (IP) e 14 como Denominação de Origem (DO).  Na Região Norte, existem oito IGs registradas, sendo que a Terra Indígena Andirá-Marau (logotipo acima) é a primeira Denominação de Origem – DO da região.

As outras IGs foram registradas na modalidade Indicação de Procedência. São elas: Região do Jalapão do Tocantins, para artesanato em capim-dourado; Rio Negro, para peixes ornamentais; Cruzeiro do Sul, para farinha de mandioca; Maués, para guaraná; Tomé-Açu, para cacau; Uarini, para farinha de mandioca; e Novo Remanso, para abacaxi.

Saiba mais sobre Indicações Geográficas em http://www.invinoviajas.com/?s=indica%C3%A7%C3%A3o

Fortaleza Wateré-Mawé: https://www.fondazioneslowfood.com/en/slow-food-presidia/satere-mawe-native-warana/

 

sábado, 21 de novembro de 2020

Para o estrelado chef José Andrés, uma das 100 pessoas mais influentes da Times, “o produto local é a chave para a alimentação do mundo”

 

Por Rogerio Ruschel

 

O Chefe de cozinha José Andrés é Asturiano e pode ser pouco conhecido por aqui, mas é um profissional regiamente premiado e um cidadão mundialmente respeitado. Já foi indicado duas vezes ao Prêmio Nobel da Paz, recebeu a Medalha Nacional de Humanidades, da Casa Branca e foi indicado tres vezes pela revista Time como uma das 100 pessoas mais influentes do mundo. Mereceu também o Prêmio de Solidariedade e Repercussão Internacional” do Clube Internacional de Imprensa. E o sucesso profissional se reflete nas duas estrelas Michellin, nos seus quase 30 restaurantes prestigiados e em uma rede de hoteis.

 

Pois este cidadão e profissional tem uma crença, com a qual compartilho e venho afirmando aqui no “In Vino Viajas” e no meu livro “O valor global do produto local”: José Andrés acredita firmemente que “O produto local é a chave da alimentação do futuro do mundo.”

 

José Andrés foi indicado duas vezes ao Prêmio Nobel da Paz pelas ações que realiza com sua World Central Kitchen (WCK), organização sem fins lucrativos que fundou em 2010 e que já serviu mais de 30 milhões de refeições em áreas de desastres naturais e outras situações de calamidade pública. A WCK se concentra em oferecer Soluções Inteligentes para a Fome e a Pobreza e usa a experiência de chefs para capacitar as pessoas a fazerem parte da solução - com foco em saúde, educação e empregos. Atualmente trabalha no Haiti, Zâmbia, República Dominicana, Nicarágua e Estados Unidos.

 


 Só durante a crise do COVID-19, já atendeu mais de 15 milhões de refeições a necessitados em todo o mundo. Aliás, desde que a pandemia do Covid-19 começou a se espalhar nos EUA, Andrés anunciou que suas seis casas (cinco em Washington e uma em Nova York) seriam transformadas em restaurantes comunitários. E na sequência lançou a iniciativa ‘Chefs For America’, que conta com 160 pontos no país todo, onde são roduzidos e entregues 150 mil marmitas diariamente para a população carente.

 

Recentemente o chef José Andrés deu uma entrevista ao jornal “El País’ da qual retiramos o que você vai ler a seguir porque leitores do “In Vino Viajas” estão sempre informados acima da média, modestia à parte.

 

Pois este super-chefe entende que “ter uma alimentação saudável e um estilo de vida adequado equivale a gerar uma sociedade mais saudável”, e que, dentro disso, “é fundamental defender no bem e nos maus momentos produtos de qualidade e locais, de proximidade”.

José Andrés é definitivamente um ardoroso defensor da importância do produto local, com identidade local, o que aqui no Brasil poderia se chamar de capiria. Ele diz que “Sou asturiano, as águas de Asturias dão-me sensação especial… Gosto de provar vinhos ou queijos de todo o mundo, mas temos de apoiar os nossos queijos, os nossos vinhos, as nossas carnes, produzidos localmente. E assim, ao mesmo tempo, é possível ser universal”.

A lógica de sua argumentação é a seguinte: ao defender um tecido produtivo local, você apóia quem trabalha para realizá-lo, você mantém as pessoas enraizadas em áreas que vão se despovoando e, dada a qualidade do produto, consome-o e divulga-o como prestígio, por sua vez abrindo portas para a sua futura exportação para todo o mundo. “Se você não vê que apoiar o local é a coisa certa a fazer, você não está realmente percebendo a importância da alimentação no futuro do mundo”.

José Andrés continua, na entrevista para o jornal El Pais:“É uma questão de saúde. Mesmo em uma situação como a que enfrentamos. O nutricionista Jesús Bernardo explica que estudos recentes mostram como uma dieta rica em vitamina C, beta-caroteno, compostos fenólicos, macro, micro e fitonutrientes estimula uma melhor resposta imunológica e nos ajuda não só a ter uma maior sensação de bem-estar, mas também a ser verdadeiramente mais fortes. Legumes, peixes, ovos ... Foi Bernardo quem de facto, no início deste século, já descreveu as qualidades excepcionais de alguns produtos típicos da franja setentrional espanhola, o que chamou de dieta cantábrica (produtos da sua horta e da sua pastagens ou o seu mar), tornou-se o ingrediente ideal para cumprir a dieta universalmente reconhecida como a mais saudável: o Mediterrâneo.”

Pois é meu caro amigo ou amiga, vou repetir a mensagem central deste fantástico Chef estrelado, profissional bem sucedido e um cidadão a ser copiado. Ele diz: “ Gosto de provar vinhos ou queijos de todo o mundo, mas temos de apoiar os nossos queijos, os nossos vinhos, as nossas carnes, produzidos localmente. E assim, ao mesmo tempo, é possível ser universal”.

Brindo a isso.

Fonte: Entrevista concedida a Alejandro Martín, do Jornal El País, de Madri, em setembro de 2020.

 

 

Saiba como a Itália promove seus produtos agroalimentares no Brasil – e porque e como vai continuar investindo

 

Por Rogerio Ruschel

Exclusivo – Entrevista com Ferdinando Fiori, Diretor da ITA - Italian Trade Agency 

Prezados amigo ou amiga, a Itália é um dos países europeus com mais tradição na produção, consumo e exportação de agroalimentos tradicionais, produzidos por agricultores familiares e empresas de pequeno ou médio ou porte. É o segundo país europeu que mais exporta estes produtos para o Brasil, e depois dos Estados Unidos, o Brasil é o mercado mais importante dos italianos nas Americas. A cultura italiana - especialmente por causa da gastronomia e dos vinhos - é muito querida e prestigiada no Brasil, onde vivem cerca de 28 milhões de descendentes - 13 milhões dos quais no Estado de São Paulo.

Sofri com amigos italianos por causa do choque do Covid-19, mas acredito que logo vão se recuperar. Por isso gostaria de saber: no que se refere a seus produtos, o que vai acontecer agora, no periodo de pós-pandemia Covid-19? Para descobrir e compartilhar com os leitores de In Vino Viajas, entrevistei Ferdinando Fiori, Diretor da ITA - Italian Trade Agency em São Paulo. Veja só o que ele nos informou.

R. Ruschel - Qual a política de promoção dos agroalimentos italianos no Brasil; quais as principais iniciativas realizadas nos últimos anos e qual será a política a partir de 2021, que deve ser o primeiro ano pós-Covid19 e pré-Acordo Mercosul X União Europeia.

 

Fernando Fiori - Os laços que unem Itália e Brasil remontam há quase 200 anos, tendo início com a vinda para o Brasil na segunda metade do século XIX de diversos artistas, intelectuais e estudiosos italianos (italianos no sentido que eram originários dos estados que compõem a atual Itália, cuja constituição atual é posterior – Rogerio: sobre isso veja nota (1) abaixo), por ocasião do casamento de D. Pedro II com a princesa das duas Sicílias, D. Teresa Cristina.

 

Esse embrião da forte presença italiana no quotidiano brasileiro tomou força com as corrente migratórias, primeiro para substituir a mão-de-obra escrava e, num segundo momento, para dar impulso à florescente indústria. Ao longo desses anos e tendo os italianos e descendentes residentes no Brasil atingindo uma população de mais de 28 milhões de pessoas, dos quais 13 milhões apenas no estado de São Paulo, foi inevitável a influência itálica na cultura brasileira e, em especial, à gastronomia do Brasil. (Rogerio: sobre este assunto veja nota (2), abaixo).

 

A culinária italiana está entre as mais apreciadas no Brasil (e no mundo) e isso se nota pelo grande número de restaurantes, pizzarias e cafés existentes no Brasil, especializados na culinária da Península, ainda que por vezes com adaptações de ingredientes e interpretações no modo de preparar ou de servir que se afastam (por vezes muito) do modo de ser italiano.

Essa receptividade aos Sabores da Itália é certamente devida à multiplicidade de pratos, mas também à simplicidade de como são feitos, com poucos produtos, mas de excelente qualidade. E é aí que entra o trabalho da ITA - Italian Trade Agency, ou seja, o de aliar a receptividade dos brasileiros à culinária italiana à promoção dos produtos feitos na Itália, por vezes segundo técnicas seculares e, em muitos casos, tuteladas por selos de qualidade (os chamados DOP, DOC, DOCG e IGP), aumentando o consumo dos mesmos. (Rogerio: veja nota (3), abaixo, sobre isso).

 

Entre essas ações, figuram as missões de compradores e jornalistas às principais feiras e distritos produtores italianos, entre os quais as feiras Cibus, Vinitaly, Interpoma e Macfrut, bem como como os distritos produtores de massas, Gragnano, ou de tomates, em Salerno, entre vários outros. Este ano, por causa do coronavirus, esses eventos ganharam contornos digitais, mas com o controle da pandemia, esperamos poder voltar aos encontros presenciais a partir do ano que vem, levando para a Itália uma centena de formadores de opinião que selecionam e trazem para o Brasil os produtos e sabores que serão consumidos por aqui numa área cada vez muito além do que São Paulo e outros grandes centros do Sul e Sudeste, sendo os produtos italianos também demandados no Centro-Oeste e em muitas cidades do Norte e Nordeste do país.

 

E não nos restringimos exclusivamente a levar compradores e formadores de opinião para a Itália. Também trazemos os produtores italianos para o Brasil, bem como reforçamos a imagem daqueles que já se encontram por aqui. Participamos, portanto, de feiras como Fispal Food Service e Wine South America, para citar apenas duas de relevância nacional, bem como organizamos ações de comunicação e promoção em pontos de vendas e canais de vendas eletrônicas. Esse é o caso da campanha Sabores da Itália, que este ano envolve a participação de 6 importantes cadeias de supermercados de São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Brasília e Paraná, além do canal de vendas eletrônicas de vinhos, EVINO, com cobertura nacional.

 

Durante essas campanhas, apresentamos os genuínos sabores da Itália, ensinando como usá-los e oferecendo-os a preços promocionais, de modo que possam ser consumidos por um número cada vez maiores de brasileiros. Falando em ensinar, aliás, também realizamos cursos de formação para chefs e amantes da gastronomia e este ano, sempre impulsionados pelos efeitos da pandemia, lançaremos, durante a V Semana da Cozinha Italiana no Mundo, uma webserie em 7 capítulos, um para cada dia da semana, que vai de 23 a 29 de novembro, que ensinará 7 pratos da culinária italiana, da tradicional à contemporânea.

 

Aliás, a Semana da Cozinha Italiana no Mundo é um dos instrumentos que usamos, sob o comando do Ministério Italiano das Relações Exteriores, para promover a excelência da cozinha italiana e de seus produtos. Nessa semana, que acontece há 5 anos, sempre em novembro, todas as cidades do mundo nas quais há uma representação diplomática italiana, realizam ações para promover a cozinha italiana e seus elementos distintivos.   

  

Rogerio Ruschel - Qual a importância do mercado brasileiro para agroalimentos italianos, excluindo queijos e vinhos? E incluindo estes produtos?

Fernando Fiori- Nos 10 primeiros meses de 2020 o Brasil importou da Itália o equivalente a 169 milhões de dólares, projetando até dezembro algo em torno de 219 milhões de dólares, ou 2,7% de tudo o que o Brasil importa de alimentos e bebidas, inclusos queijos e vinhos. Essa cifra faz da Itália o segundo principal fornecedor dos brasileiros entre os países europeus, logo atrás de Portugal (4,8%), cujos laços com o Brasil são ainda mais antigos do que os mantidos com os italianos. Além do mais, o Brasil é o segundo principal mercado dos italianos nas Américas, depois dos Estados Unidos. As importações brasileiras de vinhos projetadas para 2020, provenientes da Itália, são de 34 milhões de dólares. As de queijo são de 3,4 milhões de dólares.

 

Rogerio Ruschel - Qual a importância dos produtos italianos (agroalimentos e não alimentos) com Identificações Geográficas? Em 2017, 20,4% dos produtos com IGs vendidos dentro da União Europeia eram italianos. E no mercado brasileiro?

Fernando Fiori - É difícil dissociar uma coisa da outra. Grande parte dos produtos provenientes da Itália são de origem controlada, até porque existem mais de 300, entre os alimentos e bebidas, e outros 400, entre os vinhos. (Veja abaixo como obter estas listas).

Rogerio Ruschel - Qual o impacto da pandemia do coronavirus sobre os agroalimentos italianos – produtores, produtos, consumidores internos e exportações?

Fernando Fiori - Em linhas gerais, podemos dizer que o impacto tem três vertentes: 1) impediu o funcionamento ou diminuiu a frequência em restaurantes, que são um importante canal consumidor dos produtos italianos; 2) a pandemia acabou provocando uma relevante desvalorização do Real (mais de 35% desde o começo do ano), o que também afetou o consumo dentro de casa de algumas categorias de produtos importados, particularmente num momento de incertezas, em que a garantia do emprego era incerta; 3) a rigorosa quarentena imposta na Itália fez com que o consumo dentro de casa disparasse, reduzindo a oferta de tais produtos para a exportação. Por conta disso, projeta-se para 2020 uma diminuição das importações provenientes da Itália em cerca 2,3%.

 

Rogerio Ruschel - Qual o impacto do Brexit sobre a exportação dos agroalimentos italianos, incluindo queijos e vinhos?

Fernando Fiori - Os efeitos do Brexit ainda não puderam ser sentidos. O Reino Unido permanece um importante mercado para os italianos, representando 8,5% de suas exportações de alimentos e bebidas (3,6 bilhões de dólares). Muito provavelmente, o quadro não deve mudar, pois acordos bilaterais certamente seguirão à saída do Reino Unido do bloco, a qual  ainda não foi 100% efetivada.

Rogerio Ruschel - Já é possivel dimensionar o impacto das super-taxações dos Estados Unidos (caso Boeing x Airbus) sobre a exportação dos agroalimentos italianos, incluindo queijos e vinhos?

Ronaldo Padovani - Não parecem ter tido impacto, pelo menos até o momento. Os Estados Unidos são o segundo maior mercado dos italianos no segmento de produtos alimentares e bebidas, com quota de 11,8%, inferior apenas à verificada com a Alemanha, que é de 17,3%. Os números projetam para 2020 um aumento das exportações do setor para os Estados Unidos em 3,9%, atingindo a importância de 5 bilhões de dólares.

 

Rogerio Ruschel - A Itália tende a aprovar o Acordo Mercosul X União Europeia?

Fernando Fiori - É ainda prematuro falar sobre isso. O que se pode dizer é que esse é um acordo em que todos tendem a ganhar.

 

As fotos são livro “Giro d’Italia”, de J.A. Dias Lopes, disponível gratuitamente em www.saboresdaitalia.com.br

 

Prezado leitor ou leitora: In Vino Viajas dispõe de uma lista com 305 agroalimentos italianos protegidos por DOP, DOC, DOCG e IGP; dispomos também de uma lista com 407 vinhos DOP e 118 Vinhos IGP. Todas as listas são atualizadas e oficiais. Caso queira uma cópia, solicite aqui pelo blogue.

 

Para saber mais:

(1) Talian, o idioma italiano que só existe no Brasil: http://www.invinoviajas.com/2015/10/veneto-trentino-e-toscano-veja-como/

(2) A cultura italiana na festa do filó italiano: http://www.invinoviajas.com/2014/01/filo-italiano-abre-vindima-2014-do-vale/

(3) O trabalho da Cittá del Vino - http://www.invinoviajas.com/2015/08/citta-del-vino/

Saiba mais sobre a Itália e seus produtos: http://www.invinoviajas.com/?s=italia

 

Vídeos curtos e divertidos sobre a cultura italiana no Brasil:

Filó Italiano: https://www.youtube.com/watch?v=dwkFIgAlDSA

Talian: https://youtu.be/cZb7RK6KuG0

 

Vinho de Talha ganha um Centro Interpretativo em Vidigueira, no Alentejo – e Portugal ganha uma atração enoturística de padrão global

 

Por Rogerio Ruschel

Meu prezado amigo ou amiga, no dia 11 de novembro de 2020 (Dia de São Martinho) em Vila de Frades, município de Vidigueira, no Alentejo, foi inaugurado o Centro Interpretativo do Vinho de Talha (CIVT), um Museu para preservar o patrimônio associado à tradição milenar de saber-fazer e para promover este produto único no mundo.

Através do CIVT, os visitantes conhecerão a tradição de fazer vinho de talha, uma prática de vinificação típica do Alentejo, que foi criada há mais de 2.000 anos pelos romanos e que o município quer candidatar a Património da Humanidade. O roteiro do Museu cobre as seguintes áreas: o Território, a História Milenar (São Cucufate), a Cultura da Vinha, o Processo do Vinho na Adega e a Taberna.

Segundo a Comissão Vitivinícola Regional do Alentejo (CVRA), em Portugal, "o Alentejo tem sido o grande guardião" do vinho de talha e tem "sabido preservar" esta prática de vinificação em grandes vasilhas de barro, conhecidas como talhas, que foi passada de geração em geração, "de forma quase imutável". O jornalista Carlos Cupeto do jornal Diário do Sul relata que na inauguração os convidados puderam ouvir uma mensagem do Presidente da República Marcelo Rebelo de Souza sobre o fato de Vidigueira estar “fazendo historia” – e de fato, está.

In Vino Viajas vem acompanhando este assunto há uns cinco anos e nossos leitores conhecem o trabalho que vem sendo feito para transformar o vinho de talha em um Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade reconhecido pela Unesco. Os leitores também souberam que em julho de 2018 vinte municípios e sete entidades alentejanas se comprometeram formalmente com o projeto; agora já são mais do que isso e In Vino Viajas continua em contato com os organizadores para informar seus leitores.

Foto de Luís Amado

Saiba mais aqui:

Candidatura do Vinho de Talha do Alentejo a Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade: http://www.invinoviajas.com/2018/03/exclusivo-concelho-de-vidigueira/

Vinho de talha vai ganhar um roteiro turístico: http://www.invinoviajas.com/2019/05/vinho-de-talha/

O vinho de Talha da Cooperativa da Vidigueira: http://www.invinoviajas.com/2018/02/lanca-um-vinho-de-talha/