Por Rogerio Ruschel (*)
"Com mil taças, Batman, estes portugueses são mesmo muito espertinhos!" diria o Robin... No Alentejo conheci muitas coisas
interessantes, mas uma delas foi inesperada: visitei uma comunidade de morcegos
que trabalham em uma vinícola. Isso mesmo, meu caro leitor ou leitora: a vinícola
é a famosa Herdade do Esporão e os morcegos fazem parte de um projeto que vem
sendo realizado desde 2011 que oferece casa e comida (e roupa lavada?) para
eles defenderem os vinhedos de insetos esfomeados. Hoje a população de morcegos "empregados" com “residência fixa” nas cerca de 40
caixas já implantadas nos vinhedos é de cerca de 200 animais e os resultados,
como me disse o gestor agrícola Rui Flores, tem sido altamente positivos. Na
foto acima o Batman que é muito amigo dos morcegos mas não trabalha na Herdade – ao menos por enquanto; na
foto abaixo uma das caixas.
Talvez
você não tenha muita simpatia por morcegos, tudo bem, mas saiba que 99% de tudo que você
já ouvir falar sobre eles é preconceito; eles são polinizadores de flores e
frutos e comem insetos perigosos. O projeto da Herdade
do Esporão está atraindo morcegos-de-kuhl e
morcegos arborícolas, duas das 27 espécies existentes em Portugal, e que são
muito úteis, como diz Mário Carmo, biólogo da empresa porque "Eles são muitos pequeninos e todas
as noites comem metade do seu peso em insetos". Morcegos ajudando no controle de
pragas é apenas uma das muitas
iniciativas da conservação da biodiversidade da Herdade
do Esporão, cujo respeito pelo patrimônio ambiental e por suas práticas de
sustentabilidade vem lhe rendendo muitos prêmios.
Se você fizer uma lista de melhores práticas
empresariais em sustentabilidade, a empresa tem contribuição importante em
todas elas: realiza planejamento e gestão sustentável dos vinhedos e dos
olivais (dos 450 hectares de vinhas, 138 são agricultura biológica e os outros quase não usam produtos químicos); faz controle permanente do uso de insumos, água e energia;
pratica os 3 Rs - Reduzir, Reutilizar e Reciclar no dia-a-dia; mobiliza, informa e educa as
comunidades e seus fornecedores e busca o eco-design nos materiais produtivos
que utiliza. E segundo João Roquette, o CEO da Herdade do Esporão, neste ano de
2016 a empresa vai testar outra alternativa mais sustentável: plantar urtiga,
um repelente natural de vários insetos.
A Herdade do Esporão é uma empresa que se reinventa há mais de 700
anos. Fundada no ano de 1267 – isso mesmo, no século XIII – a Herdade do Esporão preserva três importantes monumentos históricos
na propriedade como testemunhas desta longa dedicação à atividade vitivinicola: o Arco do
Esporão, a Ermida de Nossa Senhora dos Remédios e a Torre do Esporão, construída
em torno de 1490 e que aparece no logotipo da empresa (veja na foto abaixo,
onde eu estou com o enólogo Rui Flores). Na foto acima, parte destes monumentos
arquitetônicos e uma oliveira centenária, um verdadeiro monumento ambiental.
A empresa é proprietária da Herdade do Esporão e da Herdade dos
Perdigões, no Alentejo, e da Quinta das Murças, no Douro. Nestas unidades
produz azeites de grande qualidade e alguns dos mais conhecidos vinhos de
Portugal, como o Talha, Torre, Esporão, Verdelho, Altos do Esporão e o Monte
Velho - muito popular no Brasil - além do Quinta das Murças, Alandra e Assobio,
entre outros.
Uma visita a Herdade do Esporão está em 9 de cada 10 roteiros de
enoturismo no Alentejo, e por ótimas razões: é um dos melhores de Portugal. O
turista sempre vai encontrar gastronomia de qualidade no restaurante próprio,
ótimos passeios na adega (incluindo um túnel com barricas a 17 m de
profundidade, onde descansam vinhos especiais – foto abaixo), além de poder
visitar a parte industrial (abaixo) e os vinhedos, o que pode incluir
pique-niques, caminhadas, passeios de bicicleta e observação de aves.
Para complementar a visita, a empresa oferece programas especiais de
degustação para especialistas, pequenos cursos - e no final do roteiro, a venda
de produtos com preços vantajosos na loja da quinta. Aliás, já no começo do
roteiro, no salão de entrada, o visitante pode conhecer detalhes dos
ecossistemas do Alentejo em quadros expostos nas paredes (veja abaixo).
O patrimônio histórico também é valorizado e está ao alcance dos
visitantes que podem conhecer a Torre do Esporão, o Museu Arqueológico dos
Perdigões que mantém registros de ocupações celtas com mais de 3.000 anos (foto
abaixo), a Capela de Nossa Senhora dos Remédios (também abaixo) que teve seus
afrescos restaurados, e o Arco do Esporão.
Quer dizer: quando uma empresa trabalha mais de 700 anos no mesmo ramo é
porque com certeza gosta do que faz e por isso, meu caro leitor ou leitora, não é de estranhar que estejam “contratando” os serviços de
morcegos para ajudá-los na tarefa de produzir vinhos de qualidade que respeitam
o território, a cultura e o consumidor. Faço um brinde a Herdade do Esporão e
especialmente aos morcegos, porque – coitados! – quase ninguém gosta deles…
(*) Rogerio Ruschel edita In Vino Viajas a
partir de São Paulo, Brasil e visitou a Herdade do Esporão , mas como foi durante
o dia, não pode entrevistar os morcegos quando saiam para trabalhar.