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sábado, 13 de outubro de 2018

Exclusivo: opiniões, revelações e alguns segredos de Carlos Cabral, o maior comprador de vinhos do Brasil


Por Rogerio Ruschel

Meu caro leitor ou leitora publico hoje mais uma entrevista exclusiva com umas pessoa excepcional: desta vez com o maior comprador de vinhos do Brasil, Carlos Cabral, responsável pelas operações do Grupo Pão de Açúcar – o simpático senhor da foto acima. Se você trabalha com vinhos não pode deixar de ler, porque Cabral me revelou o “caminho das pedras” (ou das gondolas) para produtores, distribuidores e importadores colocarem seus vinhos nas prateleiras das lojas. Mas se você apenas gosta de vinhos, também não deixe de ler, porque em 50 anos de vida dedicada ao vinho, Cabral certamente pode dar conselhos de grande sabedoria.
O Grupo Pão de Açucar (GPA) é a maior rede varejista do Brasil, com mais de 2.000 pontos de venda. Cerca de 1.000 lojas são da divisão GPA Alimentar e vendem vinhos nas redes Pão de Açúcar (186 lojas), Extra (300), Minuto Pão de Açúcar (82), Mini Extra (183), Assai Atacadista (130 lojas) e Compre Bem. O grupo também opera um clube de vinhos, o Viva Vinhos Pão de Açúcar.  GPA ainda tem 900 lojas das marcas Casas Bahia, Pontofrio e Lojas Bartira. A empresa faz parte do Grupo Casino, da França, e é também a maior empregadora privada do Brasil em seu segmento, com cerca de 142 mil funcionários; depois do governo federal o GPA deve ser o maior empregador brasileiro.

Pois esta empresa vende milhões de garrafas de vinhos por ano, e o comprador se chama Carlos Cabral – ou Carlos Ernesto Cabral de Mello. Cabral me recebeu no seu escritório (foto acima) e me revelou muitas coisas, mas não me disse o quanto de vinhos compra e vende por ano. Mas certamente são milhares de caixas, provavelmente milhões de garrafas. Veja a seguir algumas das revelações de Cabral.
R. Ruschel – Quantos rótulos o GPA oferece a seus clientes? Quais os vinhos mais vendidos?
C. Cabral – “No Pão de Açúcar e no Extra já tivemos à venda mais de 1.000 rótulos,  mas atualmente são cerca de 800, o que é um ótimo número porque oferece todas as alternativas para quem compra e facilita um pouco mais para nós que recebemos, estocamos, distribuimos para as lojas e gerenciamos o processo em 17 Estados brasileiros. Em termos de volume, os vinhos mais vendidos são chilenos, com 44% do volume. Depois vem os vinhos de Portugal com 15%, 10% da Argentina, 9% da Italia, 4% da França e os restantes 18% são do Brasil, Espanha, Uruguai, Alemanha, Austrália, Nova Zelandia, Estados Unidos e outras regiões. (Nota do editor: Verifiquei no site do Extra: a rede oferece aproximadamente 147 rótulos chilenos, 196 vinhos na categoria europeus, e 129 rótulos brasileiros e de outros paises.)
R. Ruschel – Quem está crescendo e quem está perdendo mercado?
C. Cabral – Além do Chile que mantém a velocidade na conquista de mercado, os portugueses parece que redescobriram o mercado brasileiro de uns três anos para cá. E estão decididos a aumentar a presença. Os espanhois fizeram nitidamente uma opção pela China e se esqueceram do Brasil, e os franceses pouco investem, talvez porque se interessam apenas por segmentos de maior valor. Os argentinos se beneficiam dos acordos de Mercosul e da proximidade e mantém posição.
R. Ruschel – E os vinhos brasileiros? Em quais você mais confia na venda, que tem mais saída?
C. Cabral – Nossos espumantes, com certeza, vão contunuar crescendo a taxas mais elevadas do que os vinhos tranquilos. Pelo menos tem potencial para isso. Acertamos a mão. Viajo com frequência e vejo que o prestígio de nossos espumantes está cada vez maior. Temos boas vendas para espumantes da Cave Geisse, da Miolo, da Casa Perini, que tem ótimos moscatéis, os da Casa Valduga e das duas cooperativas, a Garibaldi e a Aurora. Todos tem espumantes de qualidade. Já entre os vinhos tranquilos destaco os da Miolo (da campanha gaúcha), os rótulos Talento e Desejo da Salton, o Pizatto Merlot, excepcional, e os brancos da Valduga, muito bons – entre outros. Outra coisa: o suco de uva brasileiro é o melhor do mundo. Feito com uvas Isabel, Concorde e Bermont em sua maioria, parece que você pega um cacho de uvas na mão, espreme e bebe, de tão bom que é. Os produtores brasileiros tem dificuldade de atender o mercado brasileiro; se nós não  comprarmos em julho, agosto, não vamos ter suco de uva para vender em toda a rede no final do ano e verão. De fato é o melhor do mundo. 
R. Ruschel – Porque o Pão de Açucar não vende vinhos mais caros, como outras lojas independentes que podem oferecer vinhos até 40 mil Reais?
C. Cabral – De fato na rede do GPA temos lojas com perfil para vender produtos nesta faixa de preço, como o Pão de Açucar do Shopping Iguatemi, em São Paulo, que tem o tiquet médio mais elevado da rede. Mas nós evitamos por uma questão de impacto social, pela conotação que isso pode ter. Pense nisso: um cliente chega no caixa e tira do carrinho uma ou mais garrafas de vinho custando centenas de Reais cada uma, talvez o salário de um mes inteiro da moça que está operando o caixa. Eu não gosto disso e a empresa decidiu não vender, é uma opção.
R. Ruschel – Qual o caminho das pedras para um vinho chegar às prateleiras do GPA?
C. Cabral - Primeiro o vinho tem que ser bom, tem que ter qualidade. O produtor ou importador agenda comigo uma apresentação, degusto alguma coisa e ele deixa amostras que mais tarde vou compartilhar com meus dois compradores, caso os rótulos tenham qualidade. Experimentamos todos e decidimos sobre o perfil de preço que ele deve ter, o potencial de volume de vendas e a margem da loja. Se os produtos passarem por esta primeira análise, os compradores vão entrar em contato com os vendedores para negociar volumes, preços, condições de pagamento, aspectos de merchandising (frentes, gondolas, degustadores, promoções) e outras coisas. Um vinho desconhecido não consegue se vender sozinho, precisa ter degustação, precisa de ajuda inicial no ponto de venda. Cerca de 180 pessoas trabalham comigo nas lojas degustando, promovendo, cuidando e ajudando os clientes a decidirem.


R. Ruschel – Você já escreveu seis livros sobre vinhos. Está trabalhando em outro?
C. Cabral – Tenho dois projetos. O primeiro é um livro sobre as mesas da minha vida. Será mais artístico. Nos últimos 40 anos passei por centenas de mesas de todos os tipos, de jantares com amigos ou familiares a banquetes empresariais para dezenas de pessoas. E todas elas com vinhos e historias, muitas historias interessantes. (Nota do editor: Cabral já publicou seis livros (alguns na foo acima). Um dos livros mais interessantes foi sobre “A mesa e a diplomacia brasileira: o pão e o vinho da concórdia”, com 264 páginas e muito elegante, no qual Cabral explora os 6,5 milhões de documentos do Museu Histórico e Diplomático do Ministério das Relações Exteriores do Brasil. Veja o link desta reportagem no fim desta.). O segundo projeto de livro é algo assim como “O vinho e eu”, para comemorar meus 50 anos como enófilo que vou comemorar em 2019. Mas nenhum dos livros tem plano de trabalho nem data. 
R. Ruschel – Como está o projeto de exposição da tua coleção de rótulos de vinhos do Porto?
C. Cabral – Comecei minha coleção no inicio dos anos 1970 e tenho mais de 8.100 rótulos. Parece que é a maior do mundo, uma parte já apresentei nos meus livros. Gostaria de fazer uma exposição em 2019, mas ainda não consegui local e os recursos para fazê-la.
R. Ruschel – O que você acha da campanha de desmistificação do vinho que está sendo feita pelo Ibravin?
C. Cabral – É uma excelente iniciativa. Sou fiador moral, dou meu total apoio e estou procurando ajudar com ações nas seções de vinhos brasileiros de nossas lojas. Agora a Ibravin sozinha não vai mudar nada, precisa do apoio dos produtores, das vinícolas, porque elas é que estão disputando no mercado e também de produtores de regiões do Brasil além da serra gaúcha, onde o Ibravin não atua. Espero que as vinícolas brasileiras entendam esta oportunidade e se aproximem do mercado, não apenas aumentem os preços. 
R. Ruschel – E por falar em preços, quais as principais políticas públicas que a vitivinicultura brasileira necessita?
C. Cabral – Isso não é difícil. Primeiro é preciso financiamento para a reconversão dos vinhedos. Isto leva cinco anos e o vitivinicultor tem este tipo de apoio em qualquer liugar do mundo, precisamos ter no Brasil. Depois, o óbvio: uma redução drástica de impostos. O vinho não deveria pagar, não pode pagar ICMS, deveria ser considerado um alimento como em vários outros países. 
R. Ruschel – Você já esteve em quase todos os destinos de turismo do vinho do mundo. Quais os mais interessantes na sua opinião?
C. Cabral – As pessoas tem percepções diferentes do que gostam, mas para mim o primeiro é o Chile. Fica mais perto de nós, tem roteiros próximos e distantes da capital, o verão chega a 42 graus, é muito seco, e eles fazem um vinho excelente; e é muito bonito, tudo foi montado para receber o turista com qualidade. Depois viriam os roteiros de Portugal, do Alentejo ao Douro, gosto de todos, também muito bonitos e com ótimos vinhos. E no Brasil a região do Vale dos Vinhedos, com destaque para Bento Gonçalves e Garibaldi, onjde parece que tudo está preparado para receber os turistas como deveria ser. 
Meu caro leitor ou leitora, Cabral continua com suas atividades de embaixador da cultura do vinho, com palestras e cursos. Seus vídeos de educação para o consumo, do qual o episódio Boas Maneiras, número 12, já teve mais 290.000 visualizações, um espanto, continuam, embora ele tenham me ditto que vai reduzir um pouco a velocidade.
Conheça a historia de Carlos Cabral e seu legado na forma de livros nesta outra entrevista que publiquei em julho de 2017 – http://www.invinoviajas.com/2017/07/conheca-carlos-cabral/




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