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domingo, 25 de setembro de 2016

Especialista explica a importância do marketing como ferramenta para aproximar o vinho do consumidor - e não perder mercado


Por Rogerio Ruschel (*)

Entrevista exclusiva de Bruno Airaghi para In Vino Viajas – Meu prezado leitor ou leitora, mesmo que o vinho seja uma bebida charmosa, uma expressão cultural de uma comunidade, continua sendo um produto no mercado que disputa a preferência com outros milhares, e que precisa receber atenção de técnicas e ferramentas de marketing. Entrevistei um especialista no assunto para saber como isso se aplica ao vinho.  Bruno Airaghi tem uma experiência de mais de 20 anos com marketing de bebidas, tanto destilados quanto vinhos.

Nascido em em Milão, Itália, Bruno fez carreira no Brasil onde trabalhou 9 anos na Heublein (Johnny Walker, Smirnoff, Black & White) e 11 anos na Interfood (Santa Helena, Trapiche, Casal Garcia, Codorniu, Planeta, Remy Martin). Formado pela EAESP – Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas com especialização em Marketing, é diretor do Diretor de bares & restaurantes do Club Athletico Paulistano, escreve sobre vinhos e recentemente deu um curso sobre marketing de vinhos (foto abaixo) na Wine Senses, em São Paulo, a empresa de José Carlos e Joelma Santanita.

Rogerio - Você trabalhou com produtos destilados como uisque, vodca, conhaques. Quais as semelhanças e diferenças de gestão de marketing entre destilados e vinhos?
Bruno - São coisas diferentes. Nos destilados há um grande suporte de investimento em marketing pela sua cadeia produtiva - é mais rentável, inclusive (caso de vodkas).
O vinho é um produto que é fruto da terra, tradicional em sua produção com grandes investimentos em solo, adega, maquinário e pessoas na fase de colheita em especial. As semelhanças são relativas pois os dois, destilados e fermentados, prometem ao consumidor momentos especiais, elegância, requinte, bem estar etc.
O vinho ao meu ver supera o destilado, pois tem algo da alma, do lugar, do terroir enfim promove a curiosidade, harmonização com a comida, socialização entre as pessoas já que cada safra é algo distinto, parcelas de terra, altitude, etc constituem em algo único; assim, creio ser o vinho mais apaixonante. O destilado também busca suas origens, contudo é mais solitário e na maioria das vezes em nada contribui com a saúde. Fato é que trata-se de um produto mais rico de apelo mais fácil, sofrendo atualmente de uma queda (whisky) na curva de consumo por passar algo de um hábito antigo, meio fora de moda .

Rogerio - A principal tarefa do marketing é posicionar um produto. Isto é válido para vinhos?
Bruno - Como todo produto, o vinho também precisa ser posicionado para não se perder entre os concorrentes, que não são poucos. Posicionamento quanto ao preço, ao público almejado, ponto de venda, etc.

Rogerio - Qual dos elementos do produto tem maior importância em agregação de valor para um vinho? A origem, o terroir? O tipo de uva? O produtor? O preço?
Bruno - É um mix, contudo origem, produtor e preço são elementos que contribuem. Um vinho caro da Armênia, por exemplo muito bom, contudo só sendo um cientista para dar um adequado merecimento ao vinho. A casa vínicola empresta muito ao vinho quanto a tradição, valores familiares, suas conquistas  por isso algumas regiões dispensam apresentações (como da Itália, França , Espanha..)

Rogerio - O preço é um dos elementos mais subjetivos entre os 4 Ps do vinho. Como definir o preço e como gerenciar este assunto?
Bruno – Preço no Brasil é complicado, já que mais da metade do composto de preço é imposto, taxas etc. algo imexível, sem negociação . O preço é subjetivo a medida que cada importador/distribuidor tem suas planilhas de custos. A margem sabe-se que não é alta (em geral) no elo importador, já que paga a vista e recebe a prazo! No elo On Trade é onde o rotulo é mais valorizado, a margem é alta neste canal, dobrando o valor algumas vezes na carta, todavia é um "fenomeno" mundial, salvo algumas exceções. Portanto gerenciar preço é estar sempre atento a legislação, ao cambio e aos estoques e saber que atualmente é um item extremamente sensível do ponto de vista de mercado.

Rogerio - As indicacões relacionadas à produção (local, temperatura, acidez, grau alcoólico, uvas, etc) influenciam a compra?
Bruno - Neste particular as indicações no rótulo são importantes, contudo não podemos encarar isto como fator decisório em 100% dos casos. Os fundamentais são: Local/Origem, importante, por ex. Chile tem 53% de todos os vinhos finos importados no País.
Cepa: Cabernet Sauvignon, tinta mais conhecida e vendida no Brasil - é tiro certo para aqueles que buscam um vinho bom e descomplicado.

Rogerio - Qual a importância da Promoção de vendas para vinhos? Quais os tipos de promoção mais indicados? Quais os canais mais utilizados?
Bruno - No momento atual da Economia fazer promoção se tornou vital, ao menos o termo chama o consumidor, causa certa movimentação no varejo. O vinho não é exceção e no quadro atual o varejo, distribuidor precisam fazer girar a mercadoria em função de novas compras (fazer o caixa) a serem feitas visando safras novas , renovando estoques.
Existem momentos especificos que conhecemos muito bem, onde promoção de vinho é parte do calendário de inúmeras redes, enotecas, restaurantes, a saber: Inverno, Natal, Fim de Ano. São momentos mais propícios para o consumo, pela confraternização ... O modo mais indicado é quando sensibiliza o bolso, portanto rebaixa de preços, desconto por volume adquirido é o que aquece a demanda.

Rogerio - Qual a importância da internet na promoção e venda de vinhos? Porque?
Bruno - Hoje somos digitais, fazemos parte da rede social! Portanto a comunicação , a venda via mobile é fato. A internet é instantânea, assim para conquistar novos adeptos para o vinho é o clique fundamental! A versão disto é o E-commerce, com exemplos bem reais do sucesso desta modalidade (Wine.com.br ; Evino ...) estão aí , invadindo nossas telinhas com chamadas, promoções, clubes, degustações on line e por aí a fora. O sistema tradicional, com grandes equipes de vendas deverá dar lugar cada vez mais a praticidade, comodidade e conveniência via digital, lembrando que custos e sua redução implicam em ter uma versão ou plataforma digital de vendas. A influéncia desta nova era digital é transformadora de negócios, pelas vantagens que oferece numa sociedade cada vez ávida de informação e experimentação.

Rogerio - Como criar fidelidade a uma marca de vinho se, conforme a OIV anualmente são lançados cerca de 100 mil novos rótulos?
Bruno – Fidelização no vinho não é tarefa fácil.
 - Budget limitado da maioria das vinicolas para ações de fidelização.
- Importador/distribuidor não se interessa já que o brand não lhe pertence.
- O mercado é relativamente novo no Brasil, contudo quando veio ou quando abriu houve uma enxurrada, uma invasão desproporcional ao mercado, não facilitando as coisas.
- Consumidor em geral volúvel , muitas vezes vai pelo fator preço. Diante disso o que pode favorecer é o serviço prestado, como encantar o consumidor ?
   Oferecendo informações, dismitificando o vinho, sendo honesto, agradável , atendimento de nível , entendendo as dificuldades que o novo consumidor enfrenta diante de uma seção com 1000 rotulos.
Degustações são uma peça importante neste processo, viagens ás vinícolas, vivencia e experiência podem converter alguns dos tantos simpatizantes..


Rogerio - A base de consumidores do vinho está mudando, especialmente nos mercados maduros, porque os jovens estão preferindo bebidas energéticas. Como reverter isso?
Bruno - Os chamados millenials estão por aí e outros virão ... O mercado migra para oferta crescente de vinhos comportados e acessíveis, onde relação custo X beneficio será tão importante quanto o tipo da uva; portanto vinhos que se encaixam no paladar e não agridem o bolso terão cada vez mais espaço. As novas gerações estão, aos poucos, percebendo o valor do vinho, mas querem essa bebida ao seu modo, sem regras e princípios imutáveis. A sisudez do vinho cederá espaço para a flexibilidade. Hoje, variedades de espumantes e frisantes já estão fazendo a cabeça de uma boa parte de consumidores jovens. Exemplos:  Moet Ice Imperial, Bag in Box, Yellow Tail.
 
Rogerio - Qual a contribuição do enoturismo, do turismo do vinho, para a construção da imagem de marca, para a geração de fidelidade à marca e para a venda de vinhos?
Bruno - Contribuição total. Uma importante ferramenta de cultur , de bom relacionamento, de aprendizado. Ver, degustar in loco é uma experiência e tanto. O que se leva na memória em algum momento reverte em compra de um determinado vinho, não tenho dúvidas. É um álbum de fotografias!
 
(*) Rogerio Ruschel é editor de In Vino Viajas e foi profissional de agência e professor de marketing em faculdades por muitos anos – mas continua sempre querendo aprender mais

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

Calçando vinho: conheça os enotenis da Nike e Adidas, os calçados criados para desportistas que amam vinhos


Rogerio Ruschel (*)
Meu caro leitor ou leitora, se você gosta de vinhos e pratica esportes, fique atento: a Nike e Adidas, os gigantes do mundo dos calçados e das chuteiras, estão de olho nos seus pés. A estratégia dos fabricantes foi semelhante: lançar um modelo de tenis tematizado com o vinho (podemos chamá-los de “enotenis”?) para homenagear um atleta famoso que gosta de vinhos. Com um detalhe: ambos jogam (ou jogavam) nos Estados Unidos – um mercado gigantesco no consumo de vinhos e de tenis.


A Adidas foi a primeira. Em maio de 2016 a empresa alemã que tem 55.000 funcionários em 160 paises lançou a linha “Adidas Wine Pack” apresentada como uma homenagem a Kobe Bryant, ex-jogador de basquete do Los Angeles Lakers, onde fez história ao lado de Shaquille O’Neal. A coleção da Adidas tinha modelos nas cores branco e vinho, com detalhes em cortiça.

Segundo a Adidas, a homenagem foi feita porque assim como o vinho, o jogo de Bryant “melhorava ao longo dos anos”.  E tinha que ter um argumento como esse por uma razão muito simples: a Adidas tinha patrocinado Kobe entre 1999 e 2002, mas na época do lançamento Kobe Bryant era patrocinado pela concorrente Nike.

Pois quatro meses depois, em setembro de 2016, a norte-americana Nike deu o troco e lançou uma edição especial de tênis do modelo Tempo Legend 6 na cor Vinho, a predileta do atleta italiano Andrea Pirlo, que está nos Estados Unidos desde 2015, jogando no New York City.

Pirlo, considerado o melhor jogador do mundo quando a Italia ganhou a Copa do Mundo em 2006, jogou com Ronaldo na Internazionale em 1998, depois na Inter de Milão até 2011, de onde foi para a Juventus desacreditado, mas acabou sendo fundamental para levar o time ao bicampeonato italiano.

Hoje com 37 anos, Pirlo sempre foi um amante do vinho desde a infância em Flero, um pequeno vilarejo com 8.600 habitantes na Lombardia, Itália, onde passou a infância rodeado por vinhedos e vivendo pessoalmente a cultura do vinho – tanto que abriu uma vinícola chamada Pratum Coller – veja acima.

O tênis Nike Tiempo, tem a cor vinho com logotipo branco e o detalhe de quatro estrelas douradas no calcanhar (veja acima), em honra aos quatro títulos mundiais na Itália. No interior, o modelo simula a rolha de cortiça.
(*) Rogerio Ruschel é editor de In Vino Viajas baseado em São Paulo, Brasil, gosta de vinhos e de caminhar um pouquinho, mas não necessariamente de fazer as duas coisas ao mesmo tempo


terça-feira, 13 de setembro de 2016

Dono de pub na Alemanha é preso por vender garrafas de vinho homenageando Adolf Hitler


Por Rogerio Ruschel (*)
Meu caro leitor ou leitora, brindemos a isso: o proprietário de um pub em Augsburg, Bavaria, Alemanha, pode pegar até três anos de prisão depois que a polícia, atendendo denúncias anônimas, deu uma batida no seu restaurante e encontrou garrafas de um vinho para nazistas chamado Wine Führer, com fotos de Hitler e saudações nazistas como “Sieg Heil” nos rótulos.  

O dono do bar, um cidadão com 49 anos que está sendo investigado, alegou que tinha ganho as garrafas de presente - mas não lembrava de quem - e as guardou porque tinha achado "engraçado". Ele disse também que não sabia que na Alemanha fazer rotulagem de produtos contendo referências aos nazistas ou nazismo é ilegal; mas mesmo assim violou o parágrafo 86 da Constituição alemã e poderá pegar até três anos de prisão.

O que se espera é que a prisão deste sujeito seja um exemplo definitivo, porque esta historia não é nova. Estes vinhos foram vistos em outros lugares da Alemanha e Itália. Em 2014 Michael e Cindy Hirsch, da Filadélfia, Estados Unidos, estavam em Garda, na Itália, quando viram várias garrafas de vinho com imagens do ex-líder nazista em um supermercado. A mulher, que teve parentes mortos em Auschwitz, ficou chocada e fotografou as garrafas: uma delas se chamava 'Mein Kampf”, o nome do famoso livro do ditador, e outra se chamava "Volk Ein, ein Reich, ein Fuhrer» (um povo, uma império, um Fuhrer).

Segundo o Centro Simon Wiesenthal estes vinhos são feitos (ou eram feitos) por uma vinícola italiana chamada Vini Lunardelli, na cidade italiana de Rimini, desde 1995, e ao que parece ainda existem garrafas homenageando outros velhos comunistas, esquerdistas e “istas” em geral como Benito Mussolini, Che Guevara, Karl Marx, Joseph Stalin e outros, como mostra a foto acima. 
A cultura do vinho tem uma longa e bonita história em quase todas as civilizações; então porque estes idiotas tem que apelar para uma memória tão nefasta da humanidade?
(*) Rogerio Ruschel é editor de In Vino Viajas baseado em São Paulo e acredita que o vinho é uma bebida para aproximar pessoas - mesmo quando tenham crenças diferentes.

quarta-feira, 7 de setembro de 2016

Exclusivo: Fernando Guedes, CEO da Sogrape, explica por que sua empresa foi eleita pela segunda vez a melhor vinícola do mundo


Por Rogerio Ruschel (*)
Entrevista exclusiva com Fernando da Cunha Guedes, CEO da Sogrape.
Meu prezado leitor ou leitora, quando uma empresa é eleita por duas vezes seguidas como a melhor do mundo na sua área, quem é do ramo precisa saber porque. Pois a Sogrape Vinhos de Portugal S.A. teve a maior pontuação em 2015 e 2016 no ranking da World Association of Writers and Journalists of Wines and Spirits – WAWWJ, o mais importante da aldeia global vinícola – no quadro abaixo o ranking de 2016. Ser bi-campeã é um feito inédito na indústria e você vai saber porque na opinião de Fernando da Cunha Guedes, acionista e CEO da empresa (foto acima) que concedeu uma entrevista exclusiva para “In Vino Viajas”.

Fundada em 1942 a Sogrape fechou 2015 com negócios na casa dos 200 milhões de Euros; é uma multinacional portuguesa com consumidores em 120 paises que são abastecidos por mais de 100 rótulos de vinhos produzidos em Portugal, Espanha, Nova Zelândia, Argentina e Chile (na foto abaixo).

Nasceu no Douro (foto abaixo), a região vinícola com a mais antiga denominação de origem e provavelmente a mais linda do mundo; tem algumas das marcas de vinhos mais respeitadas por especialistas, e mesmo sendo internacional continua a ser uma empresa familiar – aliás, em 2012 foi eleita a “Empresa Familiar do Ano” pela Associação de Empresas Familiares de Portugal.

E na opinião de Fernando da Cunha Guedes esta é talvez a primeira das razões do excepcional desempenho da empresa, porque ser familiar na indústria do vinho ajuda a construir respeito, conservar compromissos e a criar a identidade corporativa. “Vejo uma coincidência de valores entre o que pensam os familiares acionistas e os funcionários”, resume o CEO. E deu como exemplo um compromisso com 75 anos de existência que eu mesmo confirmei ser verdadeiro: o fundador da empresa, Fernando van Zeller Guedes, dizia que na Sogrape “fazemos amigos antes de fazer negócios”. Fernando da Cunha Guedes, seu neto e representante da terceira geração da família no comando da empresa, acredita que as pessoas que trabalham na Sogrape tem amor de verdade pelo que fazem e pela empresa, porque convivem em um ambiente de méritocracia e vêem o exemplo da familia reconhecendo isso: dos quase 1000 funcionários apenas cinco são da família Guedes (foto abaixo).

Esse é um dado relevante, certamente, mas sozinho não explica porque a Sogrape supreendeu todo o mundo ao ser eleita em 2016 como bi-campeã do ranking da WAWWJ. Aliás, meu caro leitor ou leitora, é justo saber que não existe a possibilidade da Sogrape ter influenciado o resultado do ranking, porque a pontuação das empresas é a soma da pontuação que seus vinhos obtiveram em concursos ao longo do ano anterior. Algumas vinícolas podem ter um vinho excepcional premiado em muitos concursos, mas o ranking da WAWWJ, criado em 1999, se tornou o mais importante do mundo porque reconhece o desempenho do conjunto da obra, isto é: apenas soma os pontos obtidos por todos os vinhos das empresas que foram premiados nestes concursos. E veja estes números: em 2015 foram realizados 490 concursos de vinhos no mundo (de âmbito nacional e internacional) que avaliaram 680.930 produtos; destes, a WAWWJ somou os resultados de 80 concursos que tiveram pelo menos 5 países participantes e pelo menos um associado da entidade na Comissão Julgadora. O desempenho da Sogrape foi arrasador: teve 206 rótulos premiados em apenas 9 concursos, somando quase o dobro de pontos da segunda colocada, que participou de 13 concursos – veja o quadro abaixo.
Fernando Guedes considera importante a tradição portuguesa e familiar, a “vocação e paixão pelo que fazemos na Sogrape”, como diz, mas identifica na qualidade dos produtos uma segunda razão determinante para o desempenho da empresa. E como o negócio de vinhos está fundamentado no prestígio da marca, certamente ele tem razão. Com um portfólio que reúne mais de 100 marcas, entre as quais clássicos como Mateus, Gazela, Sandeman e Casa Ferreirinha, a Sogrape coleciona e preserva histórias que vem encantando gerações de apreciadores de vinhos. Guedes falou com orgulho delas, e me surpreendeu falando sobre uma das marcas mais “misteriosas” do mundo do vinho: o vinho do Porto Sandeman.

A marca Sandeman é um caso de marketing com mais de 200 anos – uma absoluta raridade no mundo dos negócios. Foi criada pelo inglês George Sandeman (foto abaixo) que começou a produzir vinho do Porto em 1790, e é uma das mais antigas marcas do mundo

A Sandeman foi a primeira empresa de vinhos do Porto a engarrafar seus próprios vinhos (o que por séculos era feito por terceiros); a primeira a exportar vinhos engarrafados e rotulados; a primeira a fazer investimento publicitário na marca, em 1905 – e isso em Londres, meu caro leitor. Entre os pioneirismos, Sandeman foi a primeira marca a ter um personagem-simbolo, o Don, criado em 1928, um cidadão misterioso com capa de estudante da Universidade de Coimbra e chapéu de Jerez – veja na imagem publicada acima. Por causa disso tudo Sandeman é a marca mais universal de vinho do Porto, prestígio que se reflete em números: em média 18.096 garrafas de Sanderman foram vendidas por dia em 2015! Por dia! Esse personagem deve valer milhões de Euros e eu suspeito que seja um dos ativos mais importantes da Sogrape. Na foto abaixo a coleção Sandeman comemorativa aos 225 anos da marca.

Mas será que o produto continua bom mesmo? Pois anote: o Sandeman Porto Tawny 40 Anos foi o sétimo vinho mais pontuado na classificação geral do ranking 2015 da Association of Writers and Journalists of Wines and Spirits - WAWWJ. De fato, o Sr. George Sandeman Primeiro fazia marketing de primeira classe no século XVIII. E aqui uma surpresa final: ele ainda faz, porque um Sr. George Sandeman Oitavo trabalha na Sogrape (que comprou a marca em 2002), fazendo a gestão da marca e do personagem misterioso criado por seu tataravô… Repito: uma raridade no mundo dos negócios.

Fernando Guedes me disse que cerca de 75% do faturamento da Sogrape vem de fora de Portugal e informou que uma das marcas responsáveis por isso é outro clássico caso de marketing da empresa: o vinho Mateus Rosé. O Mateus Rosé (acima, em sua embalagem mais recente) tem números ainda mais impressionantes do que Sandeman: com 75 anos de existência, no ano passado teve cerca de 20 milhões de garrafas vendidas em mais de 100 países – quase 55 mil garrafas por dia! A marca representa 15% do total do faturamento da empresa e as vendas aumentam cerca de 8% em média, por ano. Na foto abaixo uma etapa de produção do Mateus em foto histórica.

E este desempenho é ainda ainda mais surpreendente se considerarmos que Mateus não é um vinho tinto nem branco – é rosé, um tipo de vinho que muitas pessoas não “sabem como beber”; e além disso vem embalado em uma garrafa redondinha, inspirada nos cantis utilizados pelos soldados durante a Primeira Guerra Mundial, que pode espantar um enófilo tradicional. Veja na foto abaixo o cantil de vinho rosé da Sogrape, em uma embalagem clássica.

Pois é, o “velho” Mateus Rosé tem entre seus admiradores uma grande coleção de personalidades como Jimmy Hendrix (na foto abaixo), Amália, a Rainha de Inglaterra, Fidel Castro, a Rainha Isabel II, Calouste Gulbenkian e o Papa Paulo VI.

Fernando Guedes destaca Sandeman e Mateus Rosé para explicar o desempenho da empresa, mas outras marcas como Gazela, Casa Ferreirinha, Lan, Barca Velha, Callabriga e Quinta da Leda também são importantes. Eu perguntei a ele sobre o porque de lançar um rótulo chamado “Trinca Bolotas”, um vinho desenvolvido para ser harmonizado com carne do tradicional porco alentejano. Ele respondeu que se trata de uma homenagem a este animal que está em rápido “processo de esquecimento”, como caracterizou.

Perguntei se a Sogrape poderia estar criando uma tendência de criar vinhos harmonizadores na empresa; por exemplo, um vinho do Minho com o nome “Verde Sardinhas” ou quem sabe um tinto “Eno-Tripas”… Ele sorriu e desconversou, mas se a missão da empresa é “dar a conhecer ao mundo a variedade e a superior qualidade dos vinhos produzidos em Portugal” e nesta empresa sediada na Vila de Gaia, Porto, se respeita as tradições, quem sabe se a Sogrape não esteja de fato criando uma nova tendência?

Fernando da Cunha Guedes me disse que talvez outra das razões do bi-campeonato da empresa seja ter aceito “o desafio de conhecer e entender as novas gerações”. E explicou que recentemente a Sogrape fez uma reorganização estratégica da qual faz parte uma forte aposta na geração “Y”, conhecida como os "Millennials", os jovens que estão agora com 21 a 38 anos e nos Estados Unidos já se tornaram o segmento populacional com o maior número de consumidores de vinho. E ao que parece a Sogrape está no caminho certo, porque segundo o Wine Market Council (WMC), os “millenials” se tornaram a "geração de esperança" para o vinho.

Então, meu prezado leitor ou leitora, até agora você já viu quatro razões apontadas pelo CEO da Sogrape que ajudam a explicar o sucesso da empresa: 1) o compromisso de fazer amigos antes de fazer negócios; 2) ser uma empresa com o melhor de uma organização familiar mas com gestão profissional de padrão global; 3) só trabalhar com produtos de qualidade e não descuidar do investimento nas marcas estratégicas; e 4) buscar o reconhecimento da geração Millenial como consumidor presente e futuro de seus vinhos.

Mas existem pelo menos outras duas razões também ressaltadas por Fernando Guedes: a inovação permanente e a distribuição própria. Guedes reconhece que no universo do vinho é preciso ter tradição, mas ao mesmo tempo é necessário “dotar a empresa de uma perspectiva permanente de busca da inovação”, em suas palavras. E ressalta que a inovação deve estar em toda a gama da empresa: novas tecnologias produtivas, novas formas de conquistar consumidores, novas formas de gerar negócios, novos produtos. Uma das tecnologias é o WineBioCode, um sistema desenvolvido em parceria com a Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD) e outras entidades, que permite identificar a casta de uma uva no campo, a partir do DNA, com alta rapidez – na foto abaixo, o Douro, milenar região de pesquisas com uvas.

Talvez as principais “novidades inovativas“ estejam na forma de conquistar consumidores. De olho na renovação da base de consumidores, a Sogrape vem realizando com sucesso eventos para experimentar e promover coquetéis criativos com vinhos do Porto no grande mercado consumidor deste produto, o Reino Unido. Os jovens “millenials” como o da foto abaixo estão adorando a experiência.

O caso mais interessante de inovação para conquistar novos consumidores talvez seja um vinho lançado em agosto deste ano nos Estados Unidos, no qual Fernando Guedes aposta muito; é tão recente que nem consta do site da empresa e posso considerar que se trata de uma notícia em primeira mão para o leitor de “In Vino Viajas”. O novo produto é o “Silk & Spice” e segundo Guedes, “trata-se de um red-blend que foi desenvolvido especificamente e exclusivamente para atender um segmento de consumidores dos Estados Unidos, pessoas que buscam um vinho descomplicado”. A Sogrape desenvolveu o sabor, a garrafa e a embalagem baseada em pesquisas; no rótulo foi colocado um mapa-mundi com roteiros da “rota da seda” feita por viajantes portugueses – aliás, muito bonito, veja abaixo.

Outro aspecto valorizado por Fernando Guedes como provável razão do desempenho da Sogrape é o fato de ser global com distribuição própria. “Evidentemente temos muitas parcerias na distribuição e isso é importante, mas quando nós mesmos somos os responsáveis pela gestão do processo, temos mais facilidade para cumprir nosso compromisso fundamental de fazer amigos antes de fazer negócios”, Guedes explica. E complementa: “A distribuição própria é mais ágil e nos permite manter a identidade desta empresa familiar e global, tradicional e inovadora que procuramos criar”. 
Meu caro leitor ou leitora, aí estão pelo menos seis razões pelas quais a Sogrape Vinhos de Portugal SA foi considerada a melhor vinícola do mundo duas vezes seguidas. Tive a grata oportunidade de conversar por quase duas horas com Fernando da Cunha Guedes – o vinhateiro da foto acima - em um café do Hyatt Hotel em São Paulo, no fim de agosto, com a (agradável) participação do diretor da Sogrape no Brasil, Carlos Santo Gomes, que propiciou o encontro. Aliás, Guedes me disse que, além de ser um executivo estratégico da empresa e conhecedor dos assuntos pertinentes ao Brasil, Gomes é um especialista em China e Oriente. Santo Gomes tem histórias muito interessantes que pretendo contar para você em outra matéria, porque esta já está muito grande.
Conversamos também a atuação da Sogrape no enoturismo e fiquei sabendo de novidades que estão sendo preparadas para breve e que, evidentemente, os leitores de “In Vino Viajas” vão conhecer em primeira mão. O centro de recepção a turistas da Sandeman, em Gaia (acima), e a Quinta do Seixo, abaixo, são duas unidades de enoturismo da Sogrape.

Este encontro demonstrou que entre as vantagens de ser um jornalista que escreve sobre coisas interessantes como vinhos e a cultura do vinho, está a oportunidade de conhecer “gentlemen with brains”, cavalheiros com cérebro como dizia David Ogilvy, meu ex-chefe na agência de propaganda Ogilvy. Brindo a isso e à oportunidade de continuar escrevendo sobre boas idéias e produtos excepcionais com cavalheiros que os realizam. Tim-tim!
(*) Rogerio Ruschel é editor de In Vinho Viajas a partir de São Paulo, Brasil, e admira o trabalho das pessoas que produzem vinhos como parte de uma cultura comunitária